Comunicadoras chegaram a desafiar ordem no sábado, mas foram obrigadas a aparecer com os rostos cobertos no domingo
As apresentadoras das principais redes de televisão do Afeganistão foram ao ar neste domingo (22) com seus rostos cobertos, cumprindo ordem do Talibã que haviam desafiado na véspera. Desde que voltou ao poder no ano passado, o grupo radical impôs uma série de restrições à sociedade civil, muitas das quais buscam limitar os direitos das mulheres.
No início do mês, o chefe supremo do Talibã emitiu uma ordem, segundo a qual as mulheres devem se cobrir completamente em público, incluindo o rosto e, de preferência, com a tradicional burca. Antes, bastava um lenço, cobrindo o cabelo. A burca se tornou um símbolo global do regime linha-dura na primeira vez em que controlou o Afeganistão, de 1996 a 2001.
O temido Ministério para a Promoção da Virtude e Prevenção do Vício ordenou, na quinta-feira (19), que as apresentadoras de televisão também fizessem isso. No sábado (21), as jornalistas desafiaram a medida e foram ao ar, ao vivo, sem esconder o rosto.
Após pressão do Talibã às emissoras, as mulheres usaram, no domingo, os véus completos, revelando apenas os olhos e a testa ao apresentar as notícias nos canais TOLOnews, Ariana Television, Shamshad TV e 1TV.
– Resistimos e somos contra o uso (…). Mas a TOLOnews está sob pressão, eles (os talibã) disseram que qualquer apresentadora na tela sem cobrir o rosto deveria receber outro emprego – disse Sonia Niazi, apresentadora da TOLOnews.
Ao longo do dia, os homens que trabalham nos escritórios da TOLOnews em Cabul, capital do país, vestiram máscaras pretas, como as usadas na prevenção da Covid-19, em solidariedade às apresentadoras. À noite, apresentadores do TOLOnews e da 1TV também foram ao ar usando máscaras pretas.
O porta-voz do Ministério da Promoção da Virtude e Prevenção do Vício, Mohamad Sadeq Akif Mohajir, afirmou que as autoridades não pretendiam forçar as apresentadoras a deixar o emprego.
– Estamos felizes que os canais tenham exercido corretamente sua responsabilidade – disse.
Após ter tomado o poder novamente, em agosto, o Talibã indicou inicialmente que pretendia moderar suas posições, ao não anunciar nenhum código de vestimenta para as mulheres. Nas últimas semanas, porém, o grupo fez uma mudança radical.
PUNIÇÕES
Segundo o decreto do início do mês, as mulheres têm de usar roupas da cabeça aos pés que deixem apenas os olhos visíveis e só devem sair de casa quando necessário. Os parentes do sexo masculino enfrentarão punições por violações do código de vestimenta das mulheres, começando com uma intimação e escalando para audiências judiciais e prisão.
Os talibãs ordenaram que as mulheres que trabalham no governo sejam demitidas se não cumprirem o novo código de vestimenta. Os funcionários também correm o risco de serem suspensos se suas mulheres ou filhas não acatarem a ordem. Os canais de TV já deixaram de transmitir séries e novelas protagonizadas por mulheres, por ordem do grupo.
Em março, uma reviravolta surpreendeu quando o grupo fechou escolas de ensino médio para jovens, revertendo promessas anteriores de que meninas de todas as idades teriam acesso à educação. A medida descontentou a comunidade internacional e levou os Estados Unidos a cancelar reuniões planejadas para aliviar a crise financeira do país.
*AE