Foto: Ricardo-Stuckert/Divulgação.
Luiz Inácio Lula da Silva (PT) é o presidente que mais pediu “regime de urgência constitucional” a projetos de lei enviados ao Congresso Nacional.
Em nove meses, o petista recorreu mais ao mecanismo que seus antecessores nos primeiros doze meses de mandato. O levantamento não considera o ex-presidente Michel Temer (MDB), que assumiu o governo em meio ao processo de impeachment de Dilma Rousseff (PT).
Segundo dados compilados pela CNN, com base no Portal da Legislação, desde janeiro, Lula pediu urgência a oito projetos de lei. Não é praxe que o recurso seja usado com frequência.
No fim do primeiro semestre, porém, o governo fechou um acordo com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), para enviar mais projetos de lei em regime de urgência constitucional e menos medidas provisórias (MPs), que deverão ser editadas apenas em casos excepcionais.
De perfil centralizador, Lira gosta de costurar acordos. Como MPs têm força de lei e passam a valer assim que publicadas no Diário Oficial da União (DOU), os atos foram vistos como um “atropelo” do governo aos parlamentares, sobretudo em um cenário em que Lula tentava construir uma base de apoio no Congresso.
Em todo 2019, por exemplo, Jair Bolsonaro (PL) recorreu à urgência constitucional a projetos de lei em cinco ocasiões.
Entre as propostas, estava a que autoriza o ensino domiciliar (homeschooling) no Brasil. Por se tratar de um tema polêmico, na época, o governo recuou e cancelou o pedido de urgência.
Dilma usou o mecanismo três e quatro vezes, respectivamente, no primeiro ano de seus dois mandatos. Um dos projetos tratava da atuação de organizações terroristas. A proposta foi aprovada pelo Congresso e sancionada pela petista.
Nos nove primeiros meses deste mês, Lula bateu o próprio recorde e superou os 12 primeiros meses de seus dois mandatos com a quantidade de pedidos de urgências constitucionais.
Quando foi eleito para comandar o Palácio do Planalto pela primeira vez, em 2003, o petista não recorreu ao mecanismo em nenhuma ocasião nos 12 meses iniciais do mandato.
Já no primeiro ano do segundo mandato, Lula pediu urgência a quatro projetos, entre eles o que institui um regime de previdência complementar para os servidores públicos federais titulares de cargo efetivo, que foi aprovado pelo Congresso.
A urgência constitucional é utilizada para apressar a tramitação e a votação de matérias no Parlamento. Na prática, o regime dispensa prazos e formalidades regimentais, devendo ser votado em até 45 dias.
Caso o período não seja respeitado, o texto passa a trancar a pauta da Câmara ou do Senado, a depender da Casa onde o texto estiver tramitando. Ou seja, nenhum outro projeto de lei pode ser votado até que a proposta em urgência constitucional seja analisada pelo plenário.
O Palácio do Planalto chegou a enfrentar dificuldades para aprovar medidas de interesse do governo no primeiro semestre do ano, o que fez com que algumas medidas provisórias perdessem a validade.
Para se tornar lei em definitivo, MPs precisam ser aprovadas pelo Congresso em até 120 dias para não caducarem.
Também houve casos em que o governo chegou a cancelar MPs e reenviar os conteúdos dos atos em formato de projetos de lei. É o caso do texto que institui o “Pacto Nacional pela Retomada de Obras na Educação”, focado em retomar as obras paradas na educação básica pelo país. O projeto foi aprovado pela Câmara e ainda precisa do aval do Senado.
Outro exemplo é o programa Desenrola, criado para a renegociação de dívidas, que foi publicado como MP, mas está sendo discutido como projeto de lei. Já aprovado pela Câmara, a expectativa é que o Senado vote o texto na próxima segunda-feira (2).
O mesmo ocorreu com a proposta que estabelece regras para as apostas esportivas online, que passou a tramitar como projeto depois do governo abrir mão da MP. O tema foi aprovado pelos deputados e ainda precisa ser analisado pelos senadores.
Para Nauê Bernardo Azevedo, cientista político e advogado, a frequência com que Lula tem recorrido ao mecanismo demonstra a falta de uma base consolidada no Congresso e um sinal de que o Parlamento quer participar mais das negociações.
“O Congresso deseja ser ativo dentro do governo. […] Quando há um número tão grande de medidas provisórias caducando e sendo convertidas em projetos, isso indica que há dificuldades na articulação. E aí é preciso fazer o manejo com esses projetos de lei com urgência constitucional”, disse.
Segundo o líder do PT na Câmara, Zeca Dirceu (PR), “o grande número de pedidos de regimes de urgência é um fato positivo”. De acordo com ele, foi criado um “conceito” de evitar MPs para assuntos que podem ser discutidos por meio de um projeto de lei.
“Acredito que a medida em que se reduz o número de medidas provisórias é natural que se aumente o número de projetos que vão tramitar em regime de urgência. E tem a ver também com o restabelecimento do diálogo, da boa política, do entendimento, da busca da união e da construção do país”, afirmou.
CNN Brasil