Dona de marcas como Fiat, Peugeot, Citroën e Jeep, a Stellantis é alvo de concorrentes por ter isenção de impostos num total de R$ 5 bilhões por ano. O benefício vai até 2025, mas houve uma tentativa de prorrogar o subsídio na tramitação da reforma tributária na Câmara, ainda em discussão.
Perto de votações, lobistas das montadoras visitaram a Câmara. Um panfleto apócrifo começou a circular elencando argumentos contra a prorrogação da isenção.
O Regime Automotivo do Nordeste livra a Stellantis de pagar os 11,6% referentes ao IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) e permite que contribua com 2% de ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) —a alíquota normal é de 12%. A empresa tem uma fábrica na cidade de Goiana (PE).
Foi apresentada uma emenda à reforma tributária para a vigência do subsídio ir até 2032. A prorrogação não foi aprovada na Câmara porque faltou um voto. O fato teve implicação política, pois o líder do PT na Câmara, Zeca Dirceu, foi um dos que votaram contra.
Ele é deputado pelo Paraná e as regiões Sul e Sudeste são contra a prorrogação da isenção.Ambas sediam a maioria das montadoras que têm fábricas no Brasil.
O grupo contrário à extensão do subsídio reúne 26 marcas, mas as mais atuantes são Toyota, GM e Volkswagen. A Stellantis está sozinha porque é a única a ter uma planta na região Nordeste.
O resultado na Câmara não significou o fim da disputa. Lula é favorável à isenção e existe possibilidade de que o benefício seja retomado no Senado, onde a reforma tramita no momento. Portanto, os lobistas continuam na ativa.
Existe ainda um novo componente na discussão. A BYD tem acordo para comprar a fábrica da Ford na Bahia e produzir carros eletrificados. Deputados que articularam a reforma tributária sugeriram que a empresa conte com o subsídio por estar se instalando no país e por ter tecnologia nova.
As negociações neste sentido não avançaram na Câmara e agora a questão está com o Senado. A possibilidade de a prorrogação ser aprovada é considerada maior porque cada estado contra com três senadores. Na Câmara, o número de deputados é proporcional à população, o que favorece os estados do Sudeste.
Mas o relator da reforma tributária no Senado, Eduardo Braga (MDB-AM), disse em entrevista que deve seguir o caminho de contemplar somente a BYD. Nos bastidores, fala-se que o benefício usufruído pela Stellantis já compensou o investimento na planta de Pernambuco.
Depois de passar pelo Senado, o texto deve voltar à apreciação dos deputados e existe a possibilidade de que um terceiro round seja travado.
As montadoras reclamam ainda que a Stellantis transferiu para Pernambuco a produção da linha Jeep, veículos mais caros e mais lucrativos. O primeiro modelo a ser fabricado no local foi o Renegade, depois o Compass e agora a Commander —que seria R$ 60 mil mais barata por causa do subsídio.
As multinacionais que se opõem à Stellantis dizem que a empresa tem 31% do mercado nacional e abocanha as licitações e compras de locadoras porque tem maior margem para fornecer descontos.
Acrescentam que o subsídio bilionário não se reverte em benefícios para a população. Para isso, usam uma decisão do TCU (Tribunal de Contas da União).
Desde 2010, foram consumidos cerca de R$ 50 bilhões de recursos públicos com essas políticas, mas não houve alteração significativa na realidade socioeconômica da região.
Trecho do acórdão do TCU
A Stellantis responde com um estudo da Consultoria Ceplan que mostraria o sucesso do programa de incentivos.
Nossos estudos mostram que, para cada real de incentivo, retornam outros 5 reais de arrecadação para o estado e o governo federal – com impacto social notável.
Trecho da nota da Stellantis que cita o levantamento conduzido pela consultoria Ceplan
A empresa ainda ressalta que tem cumprido todas as condicionantes para a concessão do benefício.
A disputa entre montadoras ainda respingou na poderosa associação que reúne as montadoras, a Anfavea (Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores).
O presidente da entidade é ligado à Stellantis e havia promessa de ele não se envolver na disputa. Mas as demais montadoras o acusam de não cumprir o compromisso.
De acordo com elas, ele ligou para parlamentares e tratou da questão. A suposta atitude fez que muitas defendam que o cargo passe a ser exercido por um profissional de fora do setor.
A Anfavea negou intervenção em nota encaminhada ao UOL e alegou que não se envolve em questões desta natureza.
Nossa associação só trata de temas transversais, como políticas industriais. Temas regionais são tratados diretamente entre o poder público e as empresas interessadas.
Anfavea em nota
Informações UOL