Foto: Ricardo Stuckert/Reprodução.
Ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) mudaram de posição e deram decisões recentes interpretadas nos bastidores como tentativas de se aproximar e de manter uma boa relação com governo Lula (PT).
Após quatro anos de duros embates com o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e de ter sido um dos principais alvos dos ataques golpistas de 8 de janeiro, a corte viveu um primeiro semestre de gestão petista em clima de harmonia e com acenos recíprocos.
Uma das primeiras agendas de Lula após a eleição foi uma visita ao Supremo, onde se reuniu com os integrantes do tribunal no gabinete da presidente, ministra Rosa Weber.
Em um julgamento com impacto direto em um dos principais pilares de sustentação do PT, o ministro Gilmar Mendes alterou um voto dado anteriormente para defender o recolhimento da contribuição assistencial de trabalhadores não sindicalizados.
Em 2017, o tribunal decidiu pela inconstitucionalidade desse tipo de contribuição, que é instituída por acordo ou convenção coletiva.
No começo de 2020, Gilmar votou contra um recurso apresentado para derrubar a decisão. Agora, no entanto, afirmou que o relator, Luís Roberto Barroso, apresentou uma nova perspectiva sobre o tema que o levou à mudança de entendimento.
“Evoluindo em meu entendimento sobre o tema, a partir dos fundamentos trazidos no voto divergente [de Barroso] ora apresentado –os quais passo a incorporar aos meus– peço vênias aos ministros desta corte, especialmente àqueles que me acompanharam pela rejeição dos presentes embargos de declaração, para alterar o voto anteriormente por mim proferido”, disse.
A análise foi interrompida por pedido de vista (mais tempo para examinar o caso) do ministro Alexandre de Moraes, com placar em 3 a 0 para liberar a cobrança. Caso a tese tenha maioria, os sindicatos terão um incremento de receita e se fortalecerão.
Barroso, por sua vez, mudou de posição em relação a um integrante do primeiro escalão de Lula. Trata-se do ministro do Desenvolvimento Regional, Waldez Góes, que apresentou um recurso para anular a condenação de 2019 do STJ (Superior Tribunal de Justiça) por peculato.
O magistrado votou inicialmente contra o pedido de anulação do caso. Depois, entretanto, recuou e se posicionou para beneficiar o aliado de Lula.
O caso analisado pela Primeira Turma da corte em junho diz respeito à acusação de que Góes, quando era governador do Amapá, desviou verba destinada a pagamento de empréstimos consignados de servidores estaduais para usar o dinheiro em outras despesas do governo.
O ministro chegou a ser absolvido em primeira instância, mas o Ministério Público recorreu e, depois de ele voltar a ser governador, o caso subiu para o STJ, que o condenou.
Quando começaram a analisar o recurso, Barroso e o então ministro Marco Aurélio votaram para rejeitá-lo. Moraes, então, pediu vista. Na retomada do julgamento, Barroso mudou de entendimento e acompanhou Moraes para absolver Góes.
Ele afirmou que alterou o voto para respeitar a jurisprudência fixada pelo plenário que decidiu, em caso similar, que não há peculato em situações em que não se identifica dolo.
“Portanto, estou aqui me rendendo ao princípio da colegialidade. Até porque, verdade seja dita, quando votei pela condenação não o fiz com coração leve”, disse Barroso na sessão.
Barroso diz que votou inicialmente pela condenação porque, embora o ex-governador não tenha utilizado o dinheiro desviado para enriquecimento pessoal, ele entendia que teses firmadas pelo Supremo “devem ser universalizáveis”, e que não se podia desviar recursos do consignado mesmo que para outras finalidades públicas.
Já o ministro Dias Toffoli fez um movimento interno em abril a fim de facilitar o ambiente para que Lula indicasse seu advogado criminal e amigo pessoal Cristiano Zanin para o Supremo.
Assim que Ricardo Lewandowski se aposentou, ele pediu para mudar da Primeira para a Segunda Turma da corte, retirando os casos da Lava Jato da rota do indicado do petista e evitando constrangimentos, uma vez que Zanin é um crítico declarado da operação.
A mudança de Toffoli fez parte de uma inflexão do ministro na tentativa de se reaproximar de Lula. Ele foi indicado pelo petista para o Supremo em 2009, quando era advogado-geral da União, e sempre foi um nome de confiança do PT.
Nos últimos anos, porém, manteve uma relação próxima com Jair Bolsonaro e fez acenos à base bolsonarista, como quando classificou o golpe militar de 1964 como um “movimento”.
A decisão do ministro de não permitir que Lula fosse ao velório do irmão enquanto o petista estava preso em Curitiba foi a que causou a maior desgaste na relação entre os dois.
O ministro Edson Fachin também agiu para criar um ambiente favorável à indicação de Zanin e evitar constrangimentos com a sua escolha. Ele fez isso ao enviar para Toffoli um recurso de Lula contra a Lava Jato.
O caso estava sob responsabilidade de Lewandowski e iria ficar com Fachin temporariamente até que tomasse posse o novo ministro.
O magistrado, porém, entendeu que, como Toffoli mudou de turma, ele deveria herdar o caso. Se o processo caísse com Zanin, ele estaria impedido de julgá-lo, por ter atuado como advogado nele.
Antes disso, em 2021, a ministra Cármen Lúcia mudou de posição sobre a atuação do ex-juiz Sergio Moro e votou pela declaração de suspeição dele nos processos contra Lula.
Procurados pela reportagem, os ministros do Supremo que mudaram de voto não se manifestaram.
Créditos: Folha de São Paulo.
Incrível a coligação escancarada do supremo com o presidente, entende-se a importância de ser parceiro do poder.