Em uma fase mais pragmática dos que nos mandatos anteriores, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) contemporizou a bandeira de inclusão de minorias nos espaços de poder e optou por reduzir a participação feminina no Judiciário e no governo.
Levantamento realizado pelo UOL mostrou que, nos primeiros cinco meses de governo, Lula escolheu homens para 73% das vagas do Judiciário. Foram nomeados 33 juízes para vagas no Judiciário de todo o país. Desses, 24 são homens, e nove, mulheres. Foram escolhidos integrantes para tribunais de segunda instância, o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e o STF.
Nas últimas semanas, o presidente tem rifado ministras da Esplanada em troca de acomodar o centrão no governo. Primeiro, a titular da pasta do Turismo, Daniela Carneiro, foi demitida — a troca por deputado Celso Sabino (União-PA), antigo crítico de Lula, foi formalizada ontem.
Ana Moser, do Esporte, deve ter o mesmo destino — e não ser substituída por outra mulher. A presidente da Caixa, Rita Serrano, também já está quase de “malas prontas” e deve deixar o cargo para selar acordos políticos com o PP, legenda do presidente da Câmara, Arthur Lira.
Nas negociações com o centrão, já há quem coloque o nome da ministra da Ciência e Tecnologia, Luciana Santos, também como alvo para perder o cargo, caso outras demandas políticas dos novos aliados não sejam atendidas.
No Planalto, aliados de Lula tentam minimizar a baixa representatividade feminina —sem Daniela, o governo tem apenas 10 mulheres entre os 37 ministros. O argumento é que é importante buscar a governabilidade e dizem ser uma ‘coincidência’ o fato de o apetite do centrão por cargos estar atingindo justamente pastas comandadas por mulheres.
Segundo auxiliares de Lula, a primeira-dama, Janja da Silva, tem aparecido para tentar segurar a pressão de entrega de cargos. O mais recente movimento público da primeira-dama, no entanto, foi para defender a manutenção de Wellington Dias no Ministério do Desenvolvimento Social.
Janja também não teria gostado da fritura da atleta Ana Moser. Apesar disso, Lula já definiu que terá que abrir mão da colaboração da ex-atleta.
Fontes próximas a Janja dizem que a primeira-dama é ativa e costuma dar sua opinião a Lula sobre as decisões de governo, mas que também sabe recuar e sabe que nem sempre suas preferências irão prevalecer. E esse é o caso da pasta dos Esportes.
No Judiciário, o cenário de baixa representatividade se repete. Hoje, o STF conta com duas mulheres em um plenário com 11 integrantes. Em maio, Ricardo Lewandowski se aposentou e foi substituído por Cristiano Zanin. Rosa Weber deve se aposentar em outubro e, no lugar dela, a chance de entrar outra mulher é cada vez menor.
Lula já deixou claro que a prioridade é indicar para o STF alguém que possa ser alcançado por um telefonema. Segundo fontes ligadas ao presidente, ele hoje não tem essa proximidade com nenhuma mulher no Judiciário.
Aliados de Lula fazem campanha para que uma magistrada entre no lugar de Rosa Weber. Entre elas estão a desembargadora do TRF (Tribunal Regional Federal) da 2ª Região Simone Schreiber, a ministra do TST (Tribunal Superior do Trabalho) Katia Arruda e as advogadas Carol Proner e Dora Cavalcanti.
No entanto, Lula estaria mais inclinado a indicar para o STF pessoas próximas e que já demonstraram ser de confiança – dentre os quais, o presidente do TCU (Tribunal de Contas da União), Bruno Dantas, e o advogado-geral da União, Jorge Messias.
O ministro da Justiça, Flavio Dino, também tem forte apoio de alas da esquerda. Na mesma toada, não há expectativa de uma mulher assumir a PGR (Procuradoria-Geral da República), que tem troca de comando prevista para setembro.
O mais cotado para a vaga hoje é o vice-procurador-geral eleitoral, Paulo Gonet Branco. Também há chance de ser nomeado o subprocurador-geral da República Antonio Carlos Bigonha.
O atual ocupante do cargo, Augusto Aras, é outro nome cogitado pelo entorno de Lula. O presidente deve ignorar a lista tríplice apresentada pela categoria, que conta com dois homens e uma mulher. Hoje, Luiza Frischeisen não tem apoio político suficiente entre aliados de Lula para assumir o cargo.
O mea-culpa do presidente pode vir por meio do STJ (Superior Tribunal de Justiça), onde três vagas estão abertas. Uma das candidatas, Daniela Teixeira, tem o apoio de alas do PT.
Em visita recente ao STJ, o presidente olhou em volta e comentou que eram poucas as mulheres na corte. Segundo uma fonte que estava no local, a presidente do tribunal, Maria Thereza de Assis Moura, sugeriu ao presidente que corrigisse o cenário nas próximas nomeações. Lula não comentou.
Em 17 de setembro do ano passado, na reta final da campanha, Lula discursou em Curitiba em defesa dos direitos das mulheres, da população LGBTQIA+ e dos negros.
“Este país precisa de um presidente civilizado. Um presidente que saiba que mulher não quer ser mais objeto de cama e mesa, mulher quer ser o que ela quiser. É preciso cumprir a Constituição e regular a lei para que a mulher ganhe igual ao homem se fizer a mesma função ou ganhar mais. É preciso que a gente empodere as mulheres, pra gente não ver o crescimento do feminicídio”
Lula
Depois do anúncio da escolha de Cristiano Zanin, a presidente do STF, Rosa Weber, declarou: “No Brasil, temos muitas mulheres na base da magistratura, e decresce nos tribunais intermediários. Mas, na cúpula, como o STF, por exemplo, e nos tribunais superiores, o número de mulheres é ínfimo”.
Informações UOL