Declaração é a primeira desde que o presidente do país – que não faz parte do governo – defendeu reparar o Brasil por escravidão, massacre de indígenas e saques contra o Brasil. Neste sábado, Marcelo Rebelo de Sousa disse que o cancelamento de dívidas e oferta de financiamento são formas de compensação.
Primeiro-ministro de Portugal Luís Montenegro — Foto: Pedro Nunes/Reuters
O governo de Portugal declarou que “não esteve e não está em causa nenhum processo ou programa de ações específicas” relacionado a reparação às ex-colônias.
Em nota, o governo afirma que “as relações do povo português com todos os povos dos Estados que foram antigas colônias de Portugal são verdadeiramente excelentes, assentes no respeito mútuo e na partilha da história comum”. As informações foram divulgadas pelo jornal português Público neste sábado (27).
O posicionamento é o primeiro desde que o presidente de Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa, admitiu reparar o Brasil por conta da escravidão, das mortes de indígenas e dos saques durante a era colonial. Entre os séculos 15 e 19, seis milhões de africanos foram sequestrados, transferidos a força pelo Atlântico em navios portugueses e vendidos como escravizados, principalmente para o Brasil.
A fala de Rebelo de Sousa – o primeiro a admitir reparação histórica – foi rebatida por parlamentares da Aliança Democrática, coalização de centro-direita que governa Portugal. O líder do Chega, partido de extrema-direita, chamou o ato de traição.
Neste sábado (27), Rebelo de Sousa voltou ao assunto e disse que o cancelamento de dívidas, a oferta de financiamento às ex-colônias e a facilitação da mobilidade dos cidadãos desses países são formas de compensação.
“Não podemos colocar isso debaixo do tapete ou na gaveta. Temos a obrigação de pilotar, de liderar esse processo”, afirmou. “Mas a reparação é pagar uma indenização? Não, é uma realidade que já começou há 50 anos (…) Toda a nossa cooperação foi, durante 50 anos, além de uma construção do presente e do futuro, uma forma de reparação.”
Para o presidente, o processo de reparação não se resume, necessariamente, ao pagamento de indenização aos países envolvidos. Ele alega que essa é uma realidade que começou há 50 anos, usando como exemplo o perdão de dívidas a países colonizados, além de linhas de crédito, financiamentos e outros programas vinculados às ex-colônias.
Foram mais de quatro séculos de era colonial, quando países como Brasil, Angola, Moçambique, Benin, Cabo Verde, São Tomé e Príncipe, Timor Leste, além de partes da Índia estavam sob domínio português.
Em Portugal, o governo e a presidência da República são instituições diferentes. O governo é formado por parlamentares e liderado por um primeiro-ministro. O presidente da República é chefe de Estado e nomeia o primeiro-ministro a partir da indicação do parlamento.
Portanto, o poder do presidente acaba sendo mais simbólico e, na prática, é o premiê quem governa o país. Para que alguma medida de reparação seja efetiva, a proposta deve passar pelo Parlamento.
O debate sobre reparação não é exclusividade de Portugal. No Brasil, o Ministério Público Federal (MPF) abriu um inquérito civil público inédito para investigar o envolvimento do Banco do Brasil em crimes ligados à escravidão e tráfico de africanos no século 19.
A ação conta com a pesquisa de 14 historiadores de 11 universidades que apontam a relação da instituição com o mercado escravagista. Entre os apontamentos, o inquérito fala sobre a presença de alguns um dos maiores traficantes de escravizados da época na relação de fundadores e acionistas do Banco do Brasil.
Informações G1