A corrida para desenvolver uma vacina contra o coronavírus está causando preocupação entre as empresas farmacêuticas envolvidas nela. A maioria acredita que o poder imunizante da terapia que eles estão testando será uma realidade e que eles podem começar a distribuí-la e administrá-la até o final do ano, iniciando assim a contagem regressiva para deter o maior problema de saúde pública que abalou o mundo inteiro nos últimos cem anos.
No entanto, laboratórios e empresas de biotecnologia que trabalham nos diferentes projetos em andamento temem as conseqüências do possível aparecimento de efeitos adversos inesperados que possam ser descobertos quando for aprovada a comercialização, após a administração em massa do produto. Normalmente, o prazo para o desenvolvimento de uma vacina é longo, permitindo que os pesquisadores identifiquem possíveis falhas com grande precisão e ajustem a porcentagem de eficácia e segurança que o produto pode alcançar antes de ser colocado no mercado.
A gravidade da pandemia de SARS-CoV-2, com o consequente impacto à saúde e à economia que esta nova doença está causando, fez com que esses prazos fossem reduzidos a fim de evitar milhões de novas infecções e, assim, salvar milhares ou milhões de vidas. O que aconteceria se as vacinas que estão sendo desenvolvidas finalmente fossem administradas e a médio prazo for comprovado que elas causam algum tipo de dano colateral inesperado àqueles que a tomaram? As empresas teriam que fazer frente a responsabilidade subsequente e ao pagamento de indenizações? Isso não penalizaria a quem agiu o mais rápido possível para acabar com a pandemia? Esse dilema está provocando um importante debate na indústria farmacêutica e levou vários dos laboratórios envolvidos nos projetos a exigirem soluções.
De acordo com o que LA RAZÓN pôde saber, vários desses grupos privados que promovem os ensaios que já estão em andamento dirigiram-se à Agência Europeia de Medicamentos (EMA) exigindo uma espécie de proteção ou imunidade legal face às consequências que poderão advir desses hipotéticos efeitos adversos, caso ocorram após a colocação no mercado. Essa blidagem existe na legislação dos Estados Unidos para casos de pandemia, o que isenta as empresas naquele país da responsabilidade pelo que pode acontecer aos produtos fabricados sob tais condições.
Na Europa, segundo fontes do setor, essa legislação é inexistente. Existe uma espécie de brecha legal e deveria ser decisão de cada estado. A recomendação da Agência Européia às empresas, explicam, foi precisamente que elas fossem às autoridades de cada país, para que elas decidissem em seu território cobrir uma possível responsabilidade dos fabricantes. No momento, existem grandes grupos envolvidos no desenvolvimento da vacina com o interesse de distribuí-la também na Europa. Entre eles constam, por exemplo, AstraZeneca, Johnson & Johnson, a Modern American (que chegou a um acordo com a Rovi espanhola para a fabricação de milhões de doses) ou a chinesa CanSino Biologist.
As mesmas fontes explicam que várias empresas farmacêuticas já transferiram sua preocupação para o Ministério da Saúde, exigindo que ele contornasse o vazio jurídico com algum tipo de fórmula legal que as exonere da responsabilidade em caso de falhas de segurança não detectadas como consequência da velocidade com que pesquisa foi desenvolvida. A cobertura dessa responsabilidade subsidiária é uma das condições essenciais, asseguram, para que a imunização possa ser realizada na Espanha. Segundo as mesmas fontes, a Saúde ainda não formulou uma resposta oficial. Enquanto isso, as empresas estão trabalhando na redação de um documento para definir as condições sob as quais essa vacina teria que ser aprovada em nosso país. Essa negociação também está ocorrendo em outros estados.
[*] Sergio Alonso. “Los fabricantes de la vacuna piden al Gobierno inmunidad legal ante posibles efectos adversos”. La Razón, 23 de julho de 2020.