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No Senado, Campos Neto citou um incômodo do BC com o sistema atual de financiamento por cartão de crédito, que permite aos correntistas parcelar compras em até 13 parcelas sem juros.

Máquina de cartão — Foto: Divulgação

Máquina de cartão — Foto: Divulgação 

Em audiência no Senado na última quinta-feira (10), o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, deu declarações sobre um assunto que pode ter grande impacto para o consumidor brasileiro: o parcelamento sem juros no cartão de crédito, mecanismo oferecido, mais comumente, por grandes varejistas nacionais. 

Campos Neto citou um incômodo do BC com o sistema atual de financiamento por cartão de crédito, que permite aos correntistas parcelar compras em até 13 parcelas sem juros. 

Segundo ele, o BC estuda em criar algum tipo de “tarifa” para desincentivar a compra desenfreada no crédito em uma quantidade muito grande de parcelas – o que, com frequência, leva o comprador a perder o controle da própria fatura. 

Entenda o que Campos Neto disse e contexto das declarações: 

O que Campos Neto disse?

“Não é proibir o parcelamento sem juros. É simplesmente tentar que fique um pouco mais disciplinado. Não vai afetar o consumo. Lembrando que cartão de crédito é 40% do consumo no Brasil”, explicou Campos Neto.

De acordo com a Agência Brasil, ele afirmou: “A gente tem um parcelado sem juros, que ajuda muito o comércio, que ajuda muito a atividade, mas que tem aumentado muito o número de parcelas, de três para cinco, para sete, para nove, para 11. Hoje, o prazo médio são 13 parcelas”. 

“Então, é como se fizessem um financiamento de longo prazo sem juros. A pessoa que toma a decisão de dar os juros não é a mesma que paga pelo risco. Isso gera uma assimetria.” 

As medidas já estão em vigor? 

Não. As declarações são recentes e foram dadas no Senado, onde Campos Neto esteve para apresentação do Relatório de Inflação e do Relatório de Estabilidade Financeira do Banco Central. A ideia defendida pelo presidente da instituição, entretanto, ainda não foi formalizada. 

Campos Neto disse que uma proposta do Banco Central para o cartão de crédito rotativo deve ser apresentada nas próximas semanas. Segundo ele, há um projeto de lei ligado ao Desenrola, que está refinanciando dívidas de inadimplentes, que tem um prazo de até 90 dias para ser apresentado. 

Como funciona uma compra parcelada? 

Em uma loja que divide em 12 vezes sem juros, um item de R$ 600 pode ser adquirido em parcelas mínimas de R$ 50. 

A prática afeta também o limite do cartão. Se for de R$ 4 mil, por exemplo, seria reduzido para R$ 3,4 mil após uma compra de R$ 600. 

O valor total será restabelecido gradativamente, conforme o consumidor for pagando as faturas do cartão. 

Qual a diferença entre crédito rotativo e compra parcelada?

Quando o cliente não paga a fatura do cartão na totalidade, o restante entra na modalidade conhecida como crédito rotativo do cartão de crédito. 

Se a fatura total é de R$ 5 mil, por exemplo, mas o consumidor paga R$ 4 mil, os juros vão incidir sobre R$ 1 mil. 

Em junho, os juros sobre o rotativo chegaram a 440%. Segundo o Banco Central, esse patamar equivale a uma taxa de juros de 15% ao mês. 

Inadimplência do cartão de crédito parcelado bate recorde 

O que dizem associações do setor? 

Veja, abaixo, o que disseram sobre o assunto a Federação Brasileira de Bancos (Febraban), a Associação Brasileira de Defesa do Consumidor (Proteste) e a Associação Brasileira de Internet (Abranet). Procurada pelo g1, a Associação Brasileira de Varejo (ABV) não havia retornado até a última atualização desta reportagem. 

“A Febraban afirma que não há qualquer pretensão de se acabar com as compras parceladas no cartão de crédito. A entidade participa de grupos multidisciplinares que analisam as causas dos juros praticados e alternativas para um redesenho do rotativo, de um lado, e, de outro, o aprimoramento do mecanismo de parcelamento de compras. Portanto, nenhum dos modelos em discussão pressupõe uma ruptura do produto e de como ele se financia. 

Defendemos que o cartão de crédito deve ser mantido como relevante instrumento para o consumo, preservando a saúde financeira das famílias. Isso porque estudos indicam a necessidade de medidas de reequilíbrio do custo e do risco de crédito. Para tanto, é necessário debater a grande distorção que só no Brasil existe, em que 75% das carteiras dos emissores e 50% das compras são feitas com parcelado sem juros. 

Os estudos da Febraban mostram, ainda, que o prazo de financiamento impacta diretamente no custo de capital e no risco de crédito, e a inadimplência das compras parceladas em longo prazo é bem maior do que na modalidade à vista, cerca de 2 vezes na média da carteira e 3 vezes para o público de baixa renda. 

A Febraban continuará perseguindo uma solução construtiva que passe por uma transição gradual, para que se alcance a convergência que, ao mesmo tempo, beneficie os consumidores e garanta a viabilidade do produto para os elos que atuam na indústria do cartão de crédito, como bandeiras, bancos emissores, adquirentes (maquininhas), lojistas e consumidores”.

Proteste, via Henrique Lian, diretor de relações institucionais e mídia:

“A extinção da modalidade do rotativo do cartão de crédito, cujos juros podem chegar a 440% ao ano, é esperada (ao menos desde a limitação ao prazo máximo de um mês, ocorrida em 2017) e muito bem-vinda, especialmente se o BACEN entende que ela contribui para a melhoria das condições gerais de juros no país. Já a possível extinção dos parcelamentos sem juros, ou à criação de algum tipo de tarifa para desincentivá-lo, parece vir como um indesejado “tradeoff”. Trata-se de uma medida que não corresponde ao conceito de eficiência de mercado, pois piora significativamente a situação de dois agentes importantes: os próprios consumidores, que deixam de dispor dessa modalidade que, na prática, substituiu o clássico “crediário”, e prejudica também o varejo, que conta com essa modalidade, lembrando que as compras no cartão de crédito representam 40% do consumo no Brasil”.

“Como Abranet, cujas empresas associadas, juntas, têm mais de 70 milhões de clientes de serviços financeiros (como conta digital, cartões de crédito, débito e etc.), empresas de maquininha de cartão e que são, em sua maioria, novos entrantes e desafiantes no mercado financeiro, nos causa consternação, estranheza e preocupação, que uma decisão tão importante e impactante para todo o mercado, esteja sendo discutida com apenas uma das partes envolvidas. Prejudicar o modelo de compras parceladas em cartão de crédito no Brasil, que é responsável por 50% do volume de tudo que é transacionando em cartões de crédito, reduzirá drasticamente o consumo e impactará todo o varejo, os lojistas de todos os portes, principalmente os pequenos, as empresas de maquininha de cartão e todo o ecossistema que funciona ao redor desse mercado. É inaceitável que uma solução sobre um assunto desta magnitude e importância esteja sendo discutida de maneira unilateral, pelos grandes bancos que historicamente têm os maiores lucros do país e o maior retorno sobre o capital dos bancos do mundo.

Quando os juros de cartão de crédito, que estão na casa de 440% ao ano, são questionados, os bancos argumentam sobre o parcelado sem juros. Na visão das nossas associadas, estes assuntos não têm relação, e apontam que a inadimplência de quem compra parcelado é menor do que quem compra à vista. Tanto é, que elas oferecem parcelado sem juros, com opção de parcelar em 18 vezes, não apenas 12 vezes como é praxe do mercado.

E se algum banco concluiu que não vale a pena oferecer mais de quatro parcelas sem juros (como cita a matéria), que este banco comunique seus clientes e deixe o livre mercado atuar. Seguramente haverá outros bancos prontos para oferecer cartão com compras parceladas em 12, 18 vezes e receberão estes clientes de braços abertos. 

A solução para os altos juros está dentro dos próprios bancos, que nos últimos anos parece que foram mais agressivos do que deveriam na concessão de crédito e que tem políticas como isenção de anuidade combinada com benefícios (milhas, salas vip); e todo este custo precisa ser coberto através dos juros cobrados do rotativo. É o cenário já conhecido da baixa renda subsidiando o benefício da alta renda. 

E é ainda mais curioso que, nessa discussão sobre os altos juros, não se faça um único movimento no sentido de gerar ambiente que aumente a competição. Sem prejuízo de alterar a regra do rotativo agora, para reduzir os juros no curto prazo, o que realmente fará estes juros caírem será o aumento da competição. Iniciativas como portabilidade de dívida de cartão, assim como existe nos EUA, onde o cliente consegue facilmente transferir sua dívida de um banco para outra instituição financeira que ofereça melhores condições serão muito eficientes. 

Finalmente, alertamos aos outros setores da economia que dependem do parcelado, para que reivindiquem seu espaço na discussão de um tema tão relevante. Não podemos aceitar o fim das compras parceladas sem juros, que são uma conquista da sociedade brasileira e sucesso há 30 anos, por uma decisão unilateral para atender interesses do setor econômico que menos precisa”.

Informações G1

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