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Investidores veem com preocupação equilíbrio das contas públicas e possíveis interferências políticas no comando do Banco Central

Compromisso do governo Lula com estabilidade do quadro fiscal é questionada por revista britânica | Foto: Wilton Junior/Estadão Conteúdo
Compromisso do governo Lula com estabilidade do quadro fiscal é questionada por revista britânica | Foto: Wilton Junior/Estadão Conteúdo

Com o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), desde início do ano até a metade de junho, o real acumulou queda de 17% em relação ao dólar  o pior desempenho entre as moedas mais importantes do mundo no período. Além disso, a bolsa de valores caiu 8%, apesar da recuperação de outros mercados emergentes.

As razões para essa crise não são difíceis de adivinhar: os investidores duvidam do compromisso de Lula com políticas fiscais e monetárias responsáveis e desconfiam do seu flerte renovado com um Estado grande. É o que afirma um artigo da revista britânica The Economist, publicado na última quinta-feira, 18.

Segundo a publicação, a preocupação do mercado parece agora ter sido levada em conta, ao menos parcialmente. Neste mês, tanto Lula como sua mulher, Janja, politicamente influente, fizeram de tudo para apoiar o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e seus esforços para reduzir o déficit fiscal. Os mercados responderam: o real ganhou cerca de 5% desde o início do mês e o Ibovespa também subiu.

“Mas os sinais são confusos”, afirma o The Economist. “O governo Lula gasta muito, e ele muitas vezes parece relutar em controlar isso. Além disso, o presidente tem se intrometido em empresas controladas pelo Estado.” 

Como exemplo, a publicação cita a aproximação do fim do mandato de Roberto Campos Neto como presidente do Banco Central, que, apesar de ser independente desde 2021, pode ter seis dos nove novos membros indicados por Lula.

A preocupação imediata é fiscal. Depois de dois anos de excedentes primários, o Fundo Monetário Internacional (FMI) avalia que o Brasil tenha acumulado um déficit primário de 2% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2023. O fundo acredita que esse número deve cair para 0,7% este ano.

“O problema é que, como a política fiscal tem sido frouxa, para controlar a inflação a política monetária deve ser restritiva”, diz a publicação. 

“Isto, por sua vez, significa que o déficit global aumentou para 9,4% nos 12 meses até junho, em comparação com 5,8% para o período em 2022-2023, segundo o Goldman Sachs”, acrescenta o texto. “Isso está fazendo a dívida pública aumentar, passando de 60% do PIB em 2011 para 85% hoje e podendo atingir 95% em 2029, de acordo com o FMI.”

A publicação cita ainda que a maior parte do aumento de gastos de Lula não foi herdada do governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Os gastos deste ano, até agora, subiram 13% em termos reais em comparação com o mesmo período do ano passado.

Além disso, o petista expandiu ainda mais os benefícios para os pobres do país. Ele aumentou em mais do que a inflação o salário mínimo, ao qual estão ligadas muitas pensões e benefícios sociais do Estado. Os gastos com a segurança social aumentaram 10% em termos anuais, impulsionados por um aumento suspeito no número de requerentes por invalidez.

“As inundações catastróficas no Sul do país também aumentaram os gastos”, diz o texto. “Lula também anunciou novas políticas industriais que deverão custar R$ 1,3 bilhão cumulativamente até 2026, cerca de um décimo do PIB. Ele nomeou um aliado para dirigir a Petrobras, a empresa de energia controlada pelo Estado, levantando temores de um retorno à má gestão do passado.”

Para estabilizar a dívida, Haddad estabeleceu um novo arcabouço fiscal, que limita o aumento dos gastos do governo a 2,5% em termos reais por ano. Ele prometeu eliminar o déficit primário neste ano e registrar excedentes primários de 0,5% do PIB em 2025 e 1% em 2026.

“Mas, em abril, depois de ter deixado claro que a despesa estava superando o crescimento das receitas, Haddad pediu ao Congresso que afrouxasse as metas”, destaca a The Economist. “Os investidores temem que o governo não leve a sério o equilíbrio das contas.”

Esses receios foram amplificados pelas críticas de Lula ao Banco Central. No mês passado, o Partido dos Trabalhadores (PT) moveu uma ação contra Campos Neto para impedi-lo de fazer declarações políticas. Essa pressão dificulta ainda mais a queda da Selic, atualmente em 10,5%, conforme a inflação diminui (está em torno de 4% ao ano). Em termos reais, esta é uma das taxas de juros mais elevadas do mundo.

“Os defensores de Haddad dizem que ele está fazendo o seu melhor para manter as contas públicas em ordem, apesar da hostilidade do próprio partido”, acrescenta a publicação. Mas, até agora, ele conseguiu isso aumentando as receitas, que subiram 10% em termos reais este ano.”

Haddad tributou fundos de investimento offshore, aumentou tarifas sobre veículos importados e restabeleceu impostos sobre combustíveis. Em 3 de julho, o ministro da Fazenda se sentou com o presidente e pareceu tê-lo convencido a desistir de atacar Campos Neto.

O ministro disse que vai passar um “pente-fino” nos pagamentos da Previdência Social, o que pode levar a uma economia de R$ 25 bilhões no próximo ano. Ainda neste mês, ele deve anunciar cortes orçamentários.

Além disso, Haddad apresentou a ideia de vincular os gastos com educação e pensões à inflação. Lula rejeitou. “O que é importante é que a economia esteja crescendo, o emprego esteja crescendo, os salários estejam crescendo”, disse o presidente na semana passada.

Mas a revista britânica não vê o risco de uma crise financeira imediata. “O Banco Central tem US$ 360 bilhões em reservas, o que o torna resiliente aos choques globais”, afirma a publicação. “Para o bem ou para o mal, os brasileiros são mestres absolutos em viver à beira do abismo fiscal.”

Mas não há espaço para complacência. A população está envelhecendo e a conta da Previdência, que já absorve 44% dos gastos federais, vai subir ainda mais. A produtividade está estagnada, a educação é deficiente e a infraestrutura é de má qualidade. 

Tanto o presidente como o Congresso parecem apegados à noção de que os elevados preços das matérias-primas, o dinheiro barato dos bancos estatais e os subsídios às empresas favorecidas vão reavivar o Brasil. “Há poucas evidências que indicam que estejam corretos”, conclui o texto.

Informações Revista Oeste

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