Você já deve ter ouvido a expressão “sexo, drogas e rock and roll” como afirmação relacionada a uma vida desregrada e comportamento de liberdade e rebeldia. Eliminando o “rock and roll” da equação, eis a definição de um comportamento sexual alvo de preocupação de especialistas: o sexo químico, chemical sex ou chemsex, em inglês.
O termo significa transar sob o efeito de substâncias psicoativas — ou seja, que agem no sistema nervoso central — tanto para ampliar as sensações eróticas, quanto para que a relação sexual dure mais. Por essa razão, especialistas explicam que o comportamento é comum em festas sexuais ou sessões de sexo em grupo.
Vale lembrar, de cara, que são experiências com muitos riscos, como veremos a seguir:
A publicitária Fernanda* é adepta do uso de maconha e de LSD para transar com sua parceira, Paula*, assistente social. “Descobrimos isso por acaso, há uns três anos. Com a maconha, ficamos mais sensíveis ao toque e, assim, o tesão aflora”, explicou para Universa. “O doce (LSD) traz outra sensação: o corpo fica mais sensível, o sexo dura mais e temos uma experiência de êxtase, em transe mesmo”.
Ela descreve a mudança que sente em seu próprio corpo durante o sexo químico. “Sinto meus músculos muito mais relaxados com a cannabis. Já com o ‘doce’, eles ficam mais rígidos, então o contato entre a gente precisa ser um pouco mais forte”.
O chemsex é um comportamento sexual mais difundido fora do Brasil do que por aqui. O primeiro estudo sobre o tema, por exemplo, foi promovido pelo London School of Hygiene & Tropical Medicine, em 2014, do Reino Unido.
Na publicação, os pesquisadores apuraram inicialmente que o comportamento é mais comumente identificado em homens gays e bissexuais. Tratando o tema como caso de saúde pública, a entidade disse que a associação direta entre uso de drogas e transmissão do vírus HIVentre homens que se relacionam com homens pode ser “subjetiva”, mas levantou que “homens que usam uma variedade de drogas durante o sexo tem maior probabilidade de relatar o envolvimento em comportamentos de risco de transmissão do HIV do que os homens que não o fazem”.
Entre as drogas mais comuns, foram citadas a mefedrona, GHB/GBL (ou ecstasy líquido), cristal de metanfetamina, quetamina e cocaína. Todas são drogas psicoestimulantes.
Ecstasy (que, para os adeptos da prática, dá origem ao termo ‘sexctasy’), maconha e a mistura de drogas com Viagra — que pode levar a infarto fulminante — também são tipos de substâncias comuns entre praticantes do sexo químico, em busca de mais prazer.
Álcool em doses menores, para desinibir e despertar o desejo sexual, ou em doses maiores, que podem debilitar a percepção de risco, gerar depressão, e em alguns casos, até problemas de ereção e dificuldade de orgasmo feminino e masculino.
Por alterarem o nível de consciência e o funcionamento cognitivo da pessoa, há a associação dessa prática com os riscos de se fazer sexo desprotegido, que pode resultar em gravidez indesejada, infecções sexualmente transmissíveis e componentes emocionais. Via de regra, todas acabam delimitando a percepção de risco da pessoa, que acaba se expondo a situações que a deixam vulnerável.
Vale dizer que o uso das substâncias psicoativas com Viagra é uma prática preocupante. Nenhum médico recomenda o uso de qualquer droga, porque, de fato, não é saudável. A junção da substância com o remédio, porém, pode provocar insuficiência cardíaca, infarto fulminante, arritmia.
O maior problema é que, ao praticar sexo químico, a pessoa pode desenvolver uma preferência muito forte por fazer sexo sob efeito da droga, e começar a ter dificuldade de se engajar na relação sexual sem o uso disso.
Há vários fatores relacionados ao comportamento sexual de risco, baseados nos estudos iniciais. Há, por exemplo, uma associação a pessoas que tenham sofrido abuso sexual na infância, que tenham elevados níveis de homofobia internalizado e que apresentem sintomas de depressão.
Preocupada com a popularização do chemsexentre pessoas da comunidade LGBTQIA+, a Fundação LGBT, em Manchester, do Reino Unido, promove campanha de conscientização sobre redução de riscos entre os participantes e incentivo à prática do sexo sóbrio.
Entre as orientações de redução de risco para quem quer fazer sexo químico estão:
Fazer sexo sóbrio, de acordo com a entidade, nem sempre é fácil para quem praticou o chemsex por muito tempo. Nesse caso, as dicas são:
*Os nomes da entrevistada e da parceira foram trocados por nomes fictícios, a pedido da fonte.
Fonte: Marco Scanavino, psiquiatra e professor do Instituto de Psiquiatria da USP; Saulo Ciasca, psicoterapeuta especialista em sexualidade humana, identidade de gênero e orientação sexual.
Informações UOL