A pandemia de coronavírus deixou pelo menos 73 países em risco de escassez de remédios para tratar pessoas com HIV. O Brasil não está nesta lista, mas, no país, quem depende dos antirretrovirais também enfrentam problemas para seguir o tratamento. De acordo com o Ministério da Saúde, devido à sobrecarga dos serviços em função da pandemia, houve uma redução de 17% no número de pessoas que iniciaram a terapia antirretroviral, em comparação com o mesmo período do ano anterior.
Ao UOL, Claudia Velásquez, diretora do Unaids (programa internacional da ONU voltado ao combate à Aids) no Brasil, disse que “com certeza” há impacto na resposta ao HIV, mas que ainda não é possível cravar o tamanho dessa interferência na saúde das pessoas que vivem com o vírus.
Em Florianópolis, quando os ônibus pararam de circular no início da pandemia e parte das clínicas que distribuía os insumos fechou as portas, pacientes chegaram a passar semanas sem medicação diária e coube a um grupo de ativistas criar um sistema para fazer a entrega dos insumos aos que moram mais longe. Fabrício Bogas Gastaldi, presidente da ONG Acontece | Arte e Política LGBT+, conta que, durante cerca de três semanas, ele e ativistas do Gapa (Grupo de Apoio à Prevenção da Aids) se organizaram para levar as receitas dos pacientes até a Policlínica Centro, na região central, e voltar distribuindo os remédios de casa em casa. Essa força-tarefa consome generosa parcela.
Apesar de não haver cura para o HIV, os medicamentos antirretrovirais são capazes de controlar o vírus até deixar a carga viral indetectável no sangue.
Fabrício conta que com o nome e alguns poucos dados em mãos é possível retirar a medicação pelo paciente. Depois de três semanas, no entanto, o sistema se mostrou inviável. E nasceu a parceria com a Secretaria Municipal de Saúde, que dura até hoje.
Mesmo depois que o poder público entrou na força-tarefa, no entanto, o caminho do remédio até o paciente ainda depende muito do grupo. Cabe a Fabrício e outras duas pessoas receber pedidos de remédio pelo WhatsApp, em seus telefones pessoais, a qualquer hora do dia, e inserir os nomes na planilha.
Ele conta que sua vida parou, e ele se dedica a causa 24 horas por dia. Até quarta-feira, o sistema contava com 400 pessoas cadastradas só na capital catarinense, mas Fabrício conta que foi procurado por pessoas de municípios vizinhos.
Mesmo assim, das mais de 400 pessoas cadastradas, pelo menos 50 chegaram a passar muito tempo sem tomar as medicações, seja porque a receita não estava em dia e demorou para ser regularizada, seja por que não conhecia a possibilidade de acionar as ONGs. Há casos de pessoas que passaram três semanas sem tratamento.
A dificuldade é maior ainda para quem vive na região metropolitana, mas faz tratamento em Florianópolis: Fabrício conta que algumas puderam arcar com o Uber de uma cidade para outra, já que o transporte intermunicipal também foi interrompido, mas que há casos de pessoas que fizeram o trajeto a pé, durante três horas, para buscar o remédio.
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