Tenente-coronel vem demonstrando contrariedade com trechos divulgados sobre seu acordo de colaboração com a Polícia Federal
O tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro, vem demonstrando contrariedade com o que chama de “interpretação” ao que ele próprio teria relatado no âmbito de seu acordo de colaboração firmado com a Polícia Federal.
Após ficar quatro meses preso em uma cela do Exército, o militar decidiu contar aos investigadores sobre o que viu e ouviu durante o período em que assessorou o então presidente. Depois disso, foi solto.
As declarações do tenente-coronel são peça-chave na investigação que apura se Bolsonaro, militares e assessores palacianos tramaram saídas golpistas com o objetivo de impedir a posse de Lula e de levar os militares à rua, visto que o militar não entregou nenhuma prova.
Apesar disso, mensagens e documentos encontrados no celular e no computador dele evidenciam as tratativas sobre reverter o resultado eleitoral de 2022 – as conversas envolviam inclusive a participação de militares e do uso das Forças Armadas.
A íntegra do depoimento de Cid é mantida sob sigilo. No entanto, alguns trechos vieram à tona.
Como mostra reportagem de VEJA desta edição, o militar contou aos investigadores, conforme consta em documentos oficiais da PF, que Bolsonaro “queria pressionar as Forças Armadas para saber o que estavam achando da conjuntura” e que soube que o então comandante da Marinha, Almir Garnier, “anuiu com o golpe de Estado, colocando suas tropas à disposição do presidente”, durante uma reunião no Palácio da Alvorada.
Apesar da gravidade do que está registrado, o tenente-coronel tem desabafado a pessoas próximas que trechos do seu depoimento foram encaixados em “narrativas” que os investigadores fazem para compor a versão de que houve uma tentativa de golpe no país.
“Não sou traidor, nunca disse que o presidente tramou um golpe. O que havia eram propostas sobre o que fazer caso se comprovasse a fraude eleitoral, o que não se comprovou e nada foi feito”, disse recentemente a um interlocutor.
Na versão de Cid, ele mal foi questionado sobre o papel dos militares, “porque sabiam que eu não ia contar o que eles queriam ouvir”. Além disso, ele teria minimizado as propostas de teor golpista e dito aos investigadores que jamais viu uma “minuta de golpe” sendo apresentada aos comandantes – e, aliás, ele sequer teria usado o termo “golpe” para detalhar os encontros que presenciou enquanto esteve ao lado do ex-presidente.
Por essa versão, que carece de comprovação, o tenente-coronel relatou ter presenciado apenas a apresentação de “considerandos” aos comandantes, nos quais constavam decisões contrárias perpetradas pelo STF e pela Justiça Eleitoral contra Bolsonaro e tratadas pelo então presidente como persecutórias.
Ainda segundo Cid, Bolsonaro estava em “luto profundo” após ter sido derrotado nas urnas e se dizia alvo do Judiciário, que teria atrapalhado sua campanha. É nesse contexto que surgiam as mais diversas ideias vindas de assessores e militares. As propostas passavam por Bolsonaro reconhecer o resultado e dar fim à celeuma, fazer uma contagem paralela por meio de sites ou até botar as tropas nas ruas. Ao fim e ao cabo, ressalta Cid, nada disso foi feito.
O posicionamento, diga-se, é no mínimo controverso e esbarra em mensagens obtidas pela Polícia Federal, como a que o próprio tenente-coronel enviou a Freire Gomes relatando que Bolsonaro era pressionado a tomar uma medida “mais pesada” e, “obviamente, utilizando as forças”.
Apesar de Cid tentar minimizar as tratativas no Alvorada e garantir que Bolsonaro jamais daria um golpe, alegando que não havia estrutura ou apoio para isso, a Polícia Federal vê elementos contundentes para indiciar o ex-presidente e seu entorno por uma intentona contra o Estado democrático de direito.
Na próxima segunda-feira, 11, o militar prestará um novo depoimento aos investigadores e terá a oportunidade de tentar esclarecer, definitivamente, o que de fato aconteceu nos derradeiros dias de Bolsonaro no poder.
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