(J.R. Guzzo, publicado no jornal O Estado de S. Paulo em 18 de agosto de 2024)
No quadro de neurose avançada em que veio cair a vida pública de hoje no Brasil, passou a ser perfeitamente normal registrar como “ameaça à democracia” toda e qualquer ação humana que traga algum tipo de desconforto aos ministros do STF. É automático. Se alguém indaga, por exemplo, se está certo o ministro Fulano de Tal participar de “eventos” no exterior pagos por empresários com causas pendentes no alto judiciário, ou julgar processos em que as suas mulheres trabalhem nos escritórios de advocacia das partes, a condenação é imediata. Para o STF, tudo o que desagrada os ministros é um “ataque” ao tribunal e, portanto, à própria democracia.
É óbvio, dentro desse ambiente de paranoia oficial, que as gravações há pouco publicadas pela Folha de S.Paulo, demonstrando o uso do TSE para ajudar inquéritos penais conduzidos pelo ministro Alexandre de Moraes no STF, foram imediatamente condenadas como mais um atentado ao “Estado Democrático de Direito”. Todos os colegas de Moraes, o governo Lula em peso e os sistemas de apoio de ambos se uniram para transformar um relato jornalístico de fatos indiscutíveis em denúncia contra os que trouxeram esses fatos a público. Há um método, naturalmente, nessa indignação. Com o barulho para defender a “democracia”, não se fala no essencial: o que foi dito, realmente, nas gravações.
Tem sido assim, há cinco anos, com todas as notícias que trazem à luz do sol o que o STF está fazendo. Dizer que o inquérito perpétuo (“acaba quando acabar”, diz Moraes) aberto em 2019 para investigar notícias falsas, atos “antidemocráticos” e qualquer coisa derivada da atividade humana é ilegal, como acreditam dezenas de juristas, é tido como agressão direta às instituições. É uma “articulação de extrema direita”, também, afirmar que não houve tentativa nenhuma de golpe na baderna do dia 8 de janeiro de 2023 — por se tratar de um crime impossível. Pedir a divulgação dos vídeos comprovando que Moraes não foi agredido no aeroporto de Roma, como alega, é fascismo.
A doutrina segundo a qual Alexandre de Moraes e o Estado de Direito são a mesma coisa é uma aberração política, jurídica e moral. É também uma trapaça oportunista. O STF, o governo Lula e quem mais tira proveito da parceria entre os dois utilizam essa contrafação para submeter o Brasil à situação de país sem lei. Eles, sim, sabem muito bem o que estão fazendo quando lançam suas declarações de guerra em “defesa da democracia”. Estão garantindo a manutenção do seu Estado policial, a promoção dos seus interesses materiais e, acima de tudo, a sua própria impunidade para o que já fizeram, estão fazendo e ainda vão fazer.
Informações TBN
(J. R. Guzzo, publicado no jornal O Estado de S. Paulo em 14 de agosto de 2024)
O jornalista Glenn Greenwald é um blogueiro de extrema direita? Não, não é. A Folha de S.Paulo é um jornal golpista? Também não é. E o jurista Nelson Jobim, que foi ministro de Lula, de Dilma Rouseff e do STF, e alto tucano no tempo em que existia o PSDB ele é bolsonarista? De novo: não é. Convida-se, então, o governo Lula, a esquerda nacional e o próprio STF a explicarem por que Greenwald, que publicou as gravações que levaram a Laja Jato a óbito, publica agora na Folhagravações comprovando que o ministro Alexandre de Moraes usou a máquina do TSE para instruir decisões tomadas por ele próprio no STF. Ficam convidados, também, a esclarecer por que Jobim decidiu afirmar em público que não houve golpe de Estado nenhum no dia 8 de janeiro. É a razão de ser de toda a atividade penal do Supremo no último ano e meio: são milhares de prisões, acusações de repressão ilegal e condenações a até 17 anos de cadeia para pessoas que participaram de um quebra-quebra em Brasília. Se não houve golpe, como justificar isso tudo?
É uma cláusula pétrea na doutrina que comanda hoje todo pensamento da esquerda brasileira — criticar a conduta dos ministros do STF, dar qualquer notícia que eles não querem ver publicada e, sobretudo, dizer que o golpe do 8 de janeiro nunca existiu se deve unicamente a uma articulação da extrema direita golpista. Só os bolsonaristas, e mais ninguém, fazem esse tipo de coisa. É tudo fake news, ato antidemocrático e “ataque” ao STF. E agora, com as evidências de incesto entre STF e TSE para fabricar provas e a negação do golpe pelo ex-ministro Jobim? Estariam Glenn, a Folha e Jobim agindo de forma combinada e simultânea para fechar o Supremo e instalar uma ditadura fascista? Não faz nenhum nexo — como nada, nunca, fez nexo na ficção de que o STF é o Santíssimo Sacrário da democracia no Brasil.
O STF é aquilo que ele é no mundo das realidades, e as gravações agora publicadas sobre o tráfico de ordens obscuras no altíssimo judiciário são uma demonstração em HD das coisas que se dizem e que se fazem no mundo de sombras no qual opera a célula de ação político-policial criada no país pelo STF. É um bas-fond judiciário em que um juiz diz para um funcionário, por exemplo, que ele deve aplicar sua “criatividade” para produzir o tipo de relatório que o ministro Moraes estava querendo receber. No caso, a intenção era “desmonetizar” a Revista Oeste — e quando o funcionário diz que só encontrou conteúdos jornalísticos no material que havia examinado, recebeu a ordem de inventar alguma coisa para satisfazer o ministro. “Ele está cismado”, diz o juiz. “Quando fica assim, é uma tragédia”. Em outro momento, Moraes se mostra impaciente com a demora no atendimento de suas solicitações. “Vocês querem que eu escreva o laudo?”, diz ele. E por aí se vai — até o momento.
Isso não é “bolsonarismo” — são os fatos. Mas no Brasil de hoje existem dois tipos de fato. Um é o fato real, como o que aparece nas gravações. O outro é o fato do STF, que, depois de processado pelos ministros, passa a ser precisamente o que eles querem que seja. Na história das gravações, não houve nenhuma explicação coerente para nada — apenas uma espécie de decreto judiciário dizendo que tudo ali foi legal, pois Alexandre Moraes julgou o que ele próprio tinha feito e chegou à conclusão que era legal. O Brasil foi informado, igualmente, que tem uma nova polícia — a polícia eleitoral do TSE e que, portanto, tudo isso está valendo. Os outros ministros, o advogado-geral da União e o presidente do Senado batem palmas. Todos eles, como se sabe, são inimigos de qualquer anistia para os crimes que não foram cometidos no golpe que não foi dado — pelo simples fato, entre tantos outros, de que em dezoito meses de investigações não apareceu nenhuma prova decente contra os acusados. É possível, um dia, que venham precisar de uma anistia para si mesmos.
O advogado feirense e presidente da OAB Subseção Feira de Santana, Raphael Pitombo, foi nomeado procurador do Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) do futebol brasileiro. Pitombo tem especialização em direito desportivo e já atua há mais de 17 anos na advocacia.
O STJD tem sede no Rio de Janeiro e conta com cerca de 15 procuradores no total (Raphael Pitombo é um deles). Os procuradores deste Tribunal têm como função oferecer denúncias em face das infrações cometidas nos jogos do campeonato brasileiro, de todas as séries (de A a D), do campeonato de futebol feminino, Copa do Brasil, etc.
“Me sinto honrado em poder fazer parte desse Tribunal e poder contribuir com fortalecimento do futebol brasileiro. Mais um desafio que estou pronto para enfrentar”, afirma Pitombo. Mais informações sobre o STJD em https://www.stjd.org.br.
(J. R. Guzzo, publicado no jornal O Estado de S. Paulo em 03 de agosto de 2024)
É raro ver uma escolha indecente ir se tornando menos indecente com o passar do tempo. Decisões desse tipo não são biodegradáveis — na verdade, ficam cada vez mais perniciosas e conduzem a uma espiral crescente de emendas piores que os sonetos. É precisamente este o caso do governo Lula com a sua decisão de apoiar, para todos os efeitos práticos, o roubo das eleições na Venezuela que acaba de ser praticado pela ditadura de seu parceiro e amigo Nicolás Maduro.
O fato é que Lula decidiu ser cúmplice de um crime. Não há remédio para isso: ele está condenado, agora, a trair o comparsa ou trair o Brasil, e mesmo que decida fazer a primeira traição, para salvar o próprio couro mais adiante, a segunda já entrou no seu prontuário.
Lula, agora, está pendurado nas “atas de votação” que a “justiça eleitoral” de Maduro, um aglomerado de subalternos que até hoje nunca fez nada contra as ordens do ditador, ficou de publicar. A eleição estava obviamente roubada desde o primeiro dia de campanha; nunca foi preciso esperar “ata” nenhuma para saber que Maduro iria se declarar eleito.
A principal candidata da oposição foi proibida de concorrer pela mesmíssima “justiça eleitoral” da ditadura. A oposição indicou uma outra; também foi vetada por Maduro. Os cerca de 4 milhões de eleitores venezuelanos que vivem no exílio foram impedidos de votar. O governo prendeu, reprimiu e censurou oposicionistas. É fraude em modo extremo.
Lula, numa flagrante falsificação dos fatos, disse que não houve “nada de anormal” na eleição. O Itamaraty elogiou o clima “pacífico” da votação — e continua a ignorar a matança de pelo menos uma dúzia de oposicionistas e as 1.200 prisões que Maduro, em pessoa, anunciou que estava fazendo.
Mas mesmo com todo esse massacre, as coisas não saíram como a ditadura quis que saíssem. A fraude maciça, na cara de todo mundo, virou aberração: o ditador disse que tinha ganho antes de terminar a apuração, não mostrou nenhuma prova disso e, diante dos protestos de todas as democracias, prometeu divulgar as “atas”.
Lula se jogou de cabeça nessa mentira — com a publicação dos dados, disse ele, ia ficar tudo esclarecido. De mais a mais, quem não concordasse com os números poderia reclamar à justiça do ditador. Qual o problema?
Não veio ata nenhuma no domingo da eleição. Não veio na segunda, na terça, na quarta, na quinta, na sexta — e se vier, vão dizer que Maduro ganhou. O chefe de fato do Itamaraty, Celso Amorim, vem agora com uma tese revolucionária: a oposição tem de “provar que ganhou”. Aparentemente, o ditador está dispensado dessa mesma exigência. É o absurdo ficando cada vez mais absurdo.
Lula Martins foi o astro de cinema que conheci. Ele era o protagonista do clássico udigrudi “Meteorango Kid: Herói Intergalático”. Vi uma vez e quero ver de novo. O filme é uma miscelânea de referências culturais dentro do espírito tropicalista de geleia geral da época.
É de 1969 a película dirigida por André Luiz Oliveira. Nela há muitas imagens da então Salvador, antes do Polo Petroquímico de Camaçari e o boom populacional e imobiliário motivado por ele. A capital baiana ainda beirava os 1 milhão de habitantes. Só por isso já vale a pena rever a epopeia de Meteorango.
Mas o que me interessa aqui é prestar minha homenagem a Lula Martins. Chamá-lo de astro de cinema é reduzir bastante o artista que ele foi. Sim, ele já não está mais entre nós. A triste notícia me chegou hoje cedo num zap de seu primo Lobão: “Lula Meteorango partiu numa jornada intergaláctica”.
Do próprio Lula, a última mensagem que recebi foi de cinco de junho deste ano. Compartilhava comigo mais uma música de sua autoria, dessa vez em parceria com o filho Alef: uma canção em inglês. Não informou o título. Na ocasião, ouvi apenas alguns segundos e nada comentei. Agora a ouço integralmente e constato mais uma vez o talento que lhe era nato e, pelo jeito, transmitira também ao filho.
Lula embarcou para a sua jornada intergaláctica e deixa um legado artístico não só na música e no cinema. A sua inquietude expressiva causava nele a necessidade de manifestações plurais. As artes plásticas também fazem parte de sua vida. Ainda em 2022, estava ele lançando o movimento antroplástico em exposição no Pelourinho. A literatura não fica de fora. Antonio Luiz Martins assina o livro “Mágicas Mentiras”.
O garoto cabeludo de Jequié não era só um grande artista. Era uma “grande figura”, como dizemos ao querer exaltar uma pessoa admirável. Bom de prosa oral, nunca esqueci o relato fantástico da peripécia que cometeu, em sua cidade natal, de colocar uma rádio pirata no horário da Voz do Brasil. A façanha causou frisson na Terra do Sol.
Não posso deixar de exultar a sabedoria do grande Lula Bom Cabelo, em suas negras e lisas madeixas nunca se viu um fio grisalho, apesar dos 80 anos. Então o que podemos dizer da definição de velhice dita por ele um dia num almoço com amigos:
“A velhice começa quando os sonhos acabam e começam os queixumes”. O aforisma de nosso Herói Intergaláctico rendeu até música que fez em parceria com Luiz Caldas e César Rasec. Boa viagem, grande Lula!!!
Fonte: Pacheco Maia / Site Política Livre
*Pacheco Maia é jornalista e foi secretário de Comunicação de Salvador na gestão de ACM Neto
(J. R. Guzzo, publicado no jornal O Estado de S. Paulo em 15 de junho de 2024)
Está rolando desde julho de 2021, sob a direção do ministro Alexandre de Moraes, o inquérito policial das “Milícias Digitais” — tido pelo alto Judiciário nacional como essencial para o “enfrentamento” das articulações que, na sua opinião, querem destruir a democracia no Brasil. Deveria ter acabado em 90 dias, pelo que estabelecem as leis penais em vigor no país; continua aberto depois de três anos inteiros e acaba de ser prorrogado pela décima-primeira vez pelo ministro. Não se sabe da existência de nada parecido no mundo civilizado; aparentemente é coisa do Direito de Cuba, ou algo do mesmo bioma, onde a ditadura abriu um inquérito contra os “inimigos do Estado” 63 anos atrás, em 1959, e não fechou mais até hoje.
A investigação sobre as “milícias digitais” faz parte do “novo normal” criado pelo STF no sistema de justiça do Brasil — é o inquérito eterno, primo-irmão do flagrante perpétuo, da prisão preventiva por tempo indeterminado e outras novidades da doutrina jurídica do ministro Moraes. Também não chama mais a atenção o fato de que, após três anos de caçada implacável pelo STF, Polícia Federal e o resto da máquina estatal, não se conseguiu condenar legalmente ninguém — é natural, levando-se em conta que não existe na lei brasileira o crime de “milícia digital”. O interessante é que, para esse tipo de delito, foi abolido o princípio universal de que a lei é igual para todos, e todos são iguais perante a lei. É o nosso “avanço civilizatório”.
“O plano de trabalho é exatamente o mesmo das ‘milícias digitais’ que o STF, a PGR e a PF perseguem há anos”J. R. Guzzo
Os fatos são claros. Os repórteres Vinicius Valfré e Tácio Lorran, em reportagens publicadas no Estado de S. Paulo, revelaram com nomes, datas, lugares, números e tudo o mais que se requer de um trabalho jornalístico, o funcionamento de uma milícia digital completa dentro do Palácio do Planalto. As operações são executadas por uma espécie de “coletivo” que envolve a Secretaria de Comunicação da Presidência da República, o PT, o Instituto Lula, empresas que vendem serviços de imagem na internet e “influenciadores” que falam bem do governo e mal dos inimigos nas redes sociais. O plano de trabalho é exatamente o mesmo das “milícias digitais” que o STF, a PGR e a PF perseguem há anos: tráfico de fake news, de “desinformação”, de mentiras e do “discurso do ódio”, para ficar no grosso. Dizem, por exemplo, que Bolsonaro morreu, que Michelle se separou dele etc.; é esse o nível.
O interesse despertado por tudo isso em Moraes, Ministério Público e polícia esteve até agora entre o zero e o duplo zero — se é do governo Lula, não é milícia. A Secom, do seu lado, está perfeitamente tranquila. Decidiu gastar mais R$ 200 milhões nas redes sociais em 2024.
Informações Revista Oeste
Por Pedro Henrique Alves para Revista Oeste
‘A liberdade de matar alguém em troca de uma suposta ‘liberdade’ social e pessoal utilitária me parece um dos argumentos mais bizarros já formulados na modernidade’, afirma o colunista Pedro Henrique Alves
Debater que o aborto não é eticamente lícito sempre foi um daqueles temas que afastam as pessoas numa roda de conversa, seja por medo, remorso ou desinteresse puro e simples. Sabe aquele papo que, quando iniciado, faz as pessoas se levantarem da mesa, o famoso “espalha roda”, pois é… Eu sou um desses que, apesar de um convicto defensor da vida desde a concepção, não gostava muito de debater a temática ao ar livre até pouco tempo atrás. Porém, assim como Nelson Rodrigues, nesse assunto, eu me assumo como um “ex-covarde”. Deixe-me, então, falar sobre o que muitos não gostam de falar… E não, isso não é minha culpa, é culpa do Supremo Tribunal Federal (STF) e da Câmara dos Deputados.
Antes de mais nada, faço memória aqui a alguns corajosos que tocaram nessa mácula ética do Ocidente moderno, principalmente para não passar a imagem presunçosa de que sou a voz solitária que clama no deserto. Francisco Razzo e seu competente livro Contra o Aborto, Bernard Nathanson — um dos maiores médicos abortistas do EUA que se tornou ferrenho crítico do aborto — e seu ótimo A mão de Deus: O Ex-Rei do Aborto Fala da Própria Vida, e o menosprezado livro, mas um dos melhores para os libertários abortistas, O Argumento contra o Aborto, do igualmente libertário senador norte-americano, Ron Paul, são algumas obras sobre o assunto que destaco e indico. Não posso deixar de citar outro livro, esse de cunho historiográfico extremamente bem feito, o História do Aborto, da historiadora italiana Giulia Galeotti.
Pois bem, mas como estava dizendo, depois de muito fugir do tema — como é praxe em minha vida —, mergulhei de cabeça em debates com os defensores do aborto depois de ser provocado uma ou duas vezes apenas. Destaco que também li alguns livros de defensores da pauta para me situar da profundidade argumentativa dos defensores, cito dois como exemplo:
No primeiro, encontramos argumentos filosóficos e jurídicos tentando convencer-nos de que a liberdade de abortar e a de praticar a eutanásia inevitavelmente serão um avanço para qualquer democracia futura e estão atrelados ao princípio de liberdade individual ocidental. No segundo, a pesquisadora afirma que os argumentos cristãos de que a extrema maioria das mulheres que abortaram sofre social e psicologicamente depois de praticarem o aborto, não passa de mentira estatística, que a maioria das mulheres pesquisadas por ela se encontram felizes e em melhor estágio social e psicológico após abortarem.
Todavia, acredito que, antes das divagações sobre um mundo domado pelo mercadão de mortes de não nascidos e dos que desistiram de viver, além da satisfação social das que praticam o aborto numa manhã tranquila de primavera, devemos olhar para a questão sob uma análise da coisa em si mesma — eis minha veia filosófica pulsando aqui. O que é o aborto, afinal?
Para responder a isso, devemos focar, por primazia, no núcleo dos argumentos de ambos os lados, num canto temos os “pró-vida”, que defendem que a dignidade da vida, desde a concepção, é válida tal como a de qualquer outra pessoa da sociedade, do rei ao plebeu. Noutro corner, temos os “pró-aborto”, que defendem que a grávida tem o direito de escolher se deve ou não levar a gestação adiante, independentemente do que seja o aglomerado de células em seu útero.
O que escurece o debate, na minha visão, são duas coisas:
Enquanto que o aborto, no final das contas, é uma questão mais pragmática e eticamente fácil se nos detivermos ao ponto-chave da discussão: devemos ou não permitir a interrupção de uma vida no ventre materno pelo simples fato de escolha da mãe?
Debates sobre “onde a vida começa”, ou se, em casos onde a gravidez se revela mortal à mãe, ela deve ou não ter o direito de abortar, parecem-me cíclicos e feitos para afastar a questão central do debate. Sendo a origem da vida amplamente defendida desde a concepção pelos principais e mais neutros embriologistas, logicamente a vida humana não é um pedaço corpóreo, ou um funcionamento elétrico cerebral apenas, é um conjunto biológico que tem seu único start possível na concepção.
“A liberdade de matar alguém em troca de uma suposta ‘liberdade’ social e pessoal utilitária me parece um dos argumentos mais bizarros já formulados na modernidade”Pedro Henrique Alves
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Em muitos debates dos quais participei, os “pró-aborto” eram completamente sinceros nesse aspecto, aceitando de bom tom que tentativas de definir num momento temporal, ou de desenvolvimento fetal, onde está a vida, são argumentos fantásticos e pouco científicos. No caso de risco à mãe, por sua via, parece-me que a escolha ética recai, aí sim, sobre a mãe e seus conselheiros médicos, psicológicos e familiares, a escolha ética aqui não se dá no mero “querer”, mas numa questão de vida ou morte onde uma escolha deve ser feita para que uma das vidas seja salva, mas, reparem, aceita-se que são essencialmente vidas.
No que tange ao tom geral do debate, e com “geral” quero dizer explicitamente “político”, o tema gira em torno da liberdade individual da mulher sobre o seu corpo. É aí que a desfaçatez e as distorções retóricas entram no baile. Primeiro de tudo, o feto não é a mãe, a mãe não é o feto. O ser em seu útero é dependente da mãe, mas é também um ser diferente da mãe. Há uma dependência de nutrição e cuidado, mas, de muitas maneiras, aquele feto é autônomo e digno de ser considerado já um ser humano como qualquer outro.
Segundamente, a liberdade de matar alguém em troca de uma suposta “liberdade” social e pessoal utilitária me parece um dos argumentos mais bizarros já formulados na modernidade. Ora, partindo da verdade de que um feto é vida, autorizar alguém a matá-lo, só porque essa pessoa não quer a responsabilidade, peso ou preocupação de ser mãe ou pai, soa-me tão ancestral, bárbaro, quanto inacreditável nos dias atuais. Pior ainda é dizer fazê-lo em nome da “liberdade feminina”.
“Se, no final das contas, o feto gerado não tem de culpa nisso [estupro], por que deveria ser ele o penalizado com a pena de morte?”Pedro Henrique Alves
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A não ser que queiramos cair na esteira eugenista de definir quais vidas valem mais, e com isso dar a mão a Hitler e a outros seres abjetos da história humana, expressar uma defesa do aborto ancorada no simples ego matutino de uma mãe ou um pai — que, não raro, força a mulher a isso, e tem igual, se não pior, peso sobre o ato abortivo — parece-me um dos pontos mais vergonhosos da contemporaneidade. E, aqui, não vamos virar o rosto ao “elefante na sala de estar”. A saber, os casos de estupro.
Talvez esteja aí a situação mais nauseante que possamos imaginar nesse debate. Por isso mesmo, acredito que devamos pesar tudo com racionalidade e responsabilidade, e não somente com a emoção, pois, no final, assim como o ato do estupro em si, não parece justo que o fruto inconsciente do abuso ganhe a pena de morte sob aplausos políticos, enquanto o estuprador, se pego, passará uns seis anos detido e voltará para a sociedade com bolsas do governo e afagos de ONGs.
Não estou pupurinando a situação de uma gravidez fruto de violência, estou ponderando que, se, no final das contas, o feto gerado não tem de culpa nisso, por que deveria ser ele o penalizado com a pena de morte? Há aqui não só a morte do feto, mas a morte do direito e da própria lógica da ética.
O debate sobre o aborto é muito mais simples do que imaginamos, ele é sobre o direito legal de matar bebês no útero de suas mães. E apesar do quão duro pareça ser colocar o assunto nesses termos, o aborto é isso sem as maquiagens e as retóricas engajadas da esquerda.
“Abortar significa matar o mais inocente e indefeso dos seres de nossa espécie, o resto é penduricalho jurídico e filosófico, glitterretórico”Pedro Henrique Alves
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Por onde debati o tema, nunca um argumento “pró-aborto” pareceu ter pendido mais a balança do bom senso popular quando o colocamos às claras. Assim como num exorcismo o padre deve fazer o demônio dizer seu nome para que ele seja exorcizado, para bem entendermos a natureza do aborto, devemos dizer o que ele é em sua forma cruenta, factual. Abortar significa matar o mais inocente e indefeso dos seres de nossa espécie, o resto é penduricalho jurídico e filosófico, glitterretórico.
Por fim, eu sinceramente me questiono sobre como seria a sociedade em que as pessoas abertamente defendessem o aborto num nível consciente de tudo que disse acima. Digo socialmente mesmo, pois há nisso uma incoerência invencível em termos de ética social. Afinal, não há como convencer racionalmente alguém sobre a sacralidade da vida de um mendigo, de um órfão, de uma escrava sexual, ou de um detento preso por latrocínio, se, como pressuposto social, já aceitarmos — sob os mais vagabundos argumentos — que está tudo bem matar um bebê no útero de sua mãe.
Você confiaria em alguém que dissesse ser correto matar bebês nos úteros de suas mães?… Então por que deveríamos concordar e aceitar de bom grado quando o Estado, ou o STF, diz a mesma coisa?
A dignidade da vida humana é o pilar primevo de qualquer sociedade minimamente ordeira e livre, e se maculamos isso, no fim, só sobrará retalhos e escombros. Escombros de uma sociedade eticamente falida, retalhos de seres humanos moralmente apodrecidos.
Informações Revista Oeste
‘Eles não se conformam com um fato básico: o maior avanço jamais alcançado na história da comunicação humana abriu para dezenas de milhões de pessoas, pela primeira vez, a porta de entrada para o mundo das ideias, do debate e da opinião’
(J. R. Guzzo, publicado no jornal O Estado de S. Paulo em 5 de junho de 2024)
Existe algo profundamente errado no discurso da ministra Cármen Lúcia ao assumir a presidência do TSE. Como se estivesse lendo um manifesto do seu antecessor, o ministro Alexandre de Moraes, a nova presidente repetiu em essência o que o Comitê Central do novo regime considera o seu primeiro mandamento: “Perseguirás as fake newsacima de todas as coisas.” Eleições, na visão do Supremo Poder Judiciário, não são mais o instrumento fundamental que a população utiliza para escolher os seus governantes. Passaram a ser um perigo público. São a oportunidade que os elementos tidos como indesejáveis pelo Sistema STF-TSE usam, segundo os ministros, para espalhar notícias falsas — e, através delas, destruir a democracia. Deixaram de ser um momento de liberdade cívica. São hoje um caso de polícia.
É uma contrafação. A principal ameaça para as eleições brasileiras hoje em dia não são as fake news. É o TSE — e a sua transformação, ao longo dos últimos cinco anos, numa espécie de Tropa de Choque eleitoral que faz o policiamento dos candidatos, dos eleitores e de tudo aquilo que podem ou não podem dizer, antes, durante e depois das campanhas. Não se trata mais, apenas, de uma anomalia: manter uma “justiça eleitoral” permanente para cuidar de eleições que ocorrem a cada dois anos, coisa que não existe em nenhuma democracia do mundo. O TSE, os 27 TREs e o resto da máquina não se limitam à organização material das eleições — trabalho, aliás, que poderia ser feito por uma repartição pública qualquer, sem funções judiciais. O TSE e seus agentes, cada vez mais, interferem diretamente na disputa política. Teriam de se ater a urnas, seções eleitorais e títulos de eleitor. Vão muito além disso. Deram a si próprios o direito de resolver o que está certo e o que está errado — e, no caso das fake news, o que é verdade e mentira.
“O que ameaça a democracia não é a internet. O que ameaça a democracia são os projetos de ditadura que pedem censura”J. R.Guzzo
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É uma corrida geral em direção ao obscurantismo. O inimigo a abater, na visão dos ministros Moraes, Cármen e mais muita gente, é a internet. Eles não se conformam com um fato básico: o maior avanço jamais alcançado na história da comunicação humana abriu para dezenas de milhões de pessoas, pela primeira vez, a porta de entrada para o mundo das ideias, do debate e da opinião. Isso tirou a discussão política da panelinha estreita em que sempre esteve, sob o controle das Cármens, dos Moraes e das classes “politizadas” – e permitiu para a população uma participação inédita na vida pública do país. Obviamente, um mecanismo que pode ser utilizado por 200 milhões de brasileiros em tempo integral leva a situações tumultuadas e a um ambiente de calor, inevitáveis numa discussão livre em que ninguém precisa pedir licença para falar. As pessoas não precisam “ter razão”; não estão obrigadas a dizer a verdade, nem coisas inteligentes, equilibradas e virtuosas. Sai para fora, aí, o que tem mesmo de sair – a voz do povo brasileiro, e não a dos diplomados em ciência política. O mundo oficial não admite que seja assim.
“A mentira espalhada pelos poderosos ecossistemas das plataformas é um desaforo tirânico à integridade das democracias”, disse Cármen Lúcia. Isso não é uma análise. É um grito de guerra contra uma conquista da humanidade, disfarçada de indignação contra as “grandes empresas” internacionais que permitem a 8 bilhões de pessoas se comunicarem pela internet. A ira da ministra, e do seu habitat, é contra a mudança que a tecnologia trouxe para o debate político. O que realmente preocupa a todos eles não é a “verdade”, nem a “mentira” — e sim o fato de que a sua “verdade” não é mais a única. Nas suas bulas de excomunhão, falam como se as redes sociais só produzissem afirmações falsas, mais nada — e como se apenas a direita usasse a internet para promover “o ódio” e divulgar fake news. Há, enfim, avisos escuros quando Cármen acusa a internet de “contaminar escolhas” e “adoecer pela desconfiança cidadãs e cidadãos”. As escolhas do cidadão, adverte a ministra, podem estar “contaminadas”; cuidado com elas. Criticar pode ser a doença da “desconfiança”; cuidado com as críticas.
O que ameaça a democracia não é a internet. O que ameaça a democracia são os projetos de ditadura que pedem censura, prisões políticas, repressão às opiniões contrárias e o que mais costuma haver na caixa de ferramentas dos regimes de força. A preocupação da ministra e de quem está ao seu redor não são as notícias falsas. É o resultado que pode sair de eleições livres.
Informações Revista Oeste
Por J.R Guzzo para Revista Oeste
Quando a direita ganha na votação popular, é porque o povo está sendo ‘contra a democracia’ — e isso não pode ser admitido pelos que se julgam condutores do ‘processo civilizatório’
À primeira vista, é um perfeito contrassenso. As eleições na Europa, dentro de cada país e no plano geral do Parlamento europeu, estão sendo apresentadas como uma ameaça mortal para a democracia. Por quê? Porque a direita tem boas chances de avançar mais. Tem sido assim nestes últimos tempos. A cada vez que a população é chamada para manifestar a sua vontade nas urnas, a direita ganha mais espaço e põe mais gente nos governos. Mas como os resultados de uma eleição limpa poderiam ser uma ameaça para a democracia? A ideia essencial das sociedades livres é exatamente esta: vai para o governo quem obtiver mais votos dos cidadãos. Estão querendo dizer, então, que só há democracia quando a esquerda ou o “centro” ganham a eleição? Chega-se aí à segunda vista, e por esta segunda vista não há contrassenso nenhum. Na visão unânime das elites políticas, culturais e econômicas, na Europa e no resto do mundo, é precisamente disso que se trata. Quando a direita ganha na votação popular, é porque o povo está sendo “contra a democracia” — e isso não pode ser admitido pelos que se julgam condutores do “processo civilizatório”. De acordo com a elite mundial, em suma, as eleições livres são hoje o maior perigo que existe para o Estado democrático. Assumiram o mandamento fundamental dos regimes de esquerda: o povo, realmente, não pode votar, porque se pudesse iria votar contra a gente.
É daí que vem a crescente histeria das mentes civilizadas diante do quadro eleitoral da Europa. Vai haver, já agora em junho, eleições gerais para o Parlamento da União Europeia, com 705 deputados dos 27 países membros. As previsões mostram que a direita é quem tem mais chances de crescer — e como lá não é a Venezuela, onde todos os candidatos viáveis da oposição são proibidos de concorrer, a esquerda e seus aliados de “centro”, ou coisa parecida, estão vivendo momentos de ansiedade intensa. Depois disso pode acontecer um horror maior ainda: uma possível vitória de Donald Trump nas eleições dos Estados Unidos, descrita pelas vozes do “equilíbrio” como um passo direto rumo à Terceira Guerra Mundial e à volta do mundo à Idade da Pedra Lascada. Já houve a eleição de Javier Milei na Argentina. Haverá até mesmo as eleições municipais no Brasil, em outubro próximo — e o governo Lula, a dupla STF-TSE e a esquerda nacional estão num estado de pré-pânico com o que pode acontecer.
A ideia-matriz, nisso tudo, é a tentativa de impor uma nova definição para o conceito de democracia: todos podem votar, mas não podem votar nos candidatos, nas ideias e nos valores que preferem. Têm, necessariamente, de aderir às Escrituras da esquerda, que determinam a obediência ao vasto X-tudo montado por seus comissários. O sujeito, aí, tem de professar fé no “Estado”, a quem deve amar acima de todas as outras coisas. Tem de ser a favor dos movimentos negro, indígena, feminista, quilombola e identitário. Tem de denunciar a “crise do clima”, as fake news e as grandes fortunas. Tem de ser a favor da regulamentação de tudo o que se move sobre a face da Terra. Tem de ser contra a liberdade de expressão, o lucro e a ideia geral de Deus, Pátria e Família. Tem de achar que as cores verde e amarela, juntas, são fascistas. Tem de apoiar o Hamas. Tem de denunciar o sionismo, Israel e os judeus em geral. Da mesma forma, está proibido de dizer que o comunismo deu errado. Não pode ser contra os criminosos, nem apoiar a polícia. Não pode, em resumo, pensar com a sua própria cabeça. Se pensar, e se quiser votar conforme pensa, estará sendo uma ameaça para a democracia.
Não se pode, é claro, voltar à democracia da Grécia de 500 antes de Cristo. Na época, os riscos de que o eleitor aprovasse ideias erradas eram eliminados a pau — para começar, com a redução ao mínimo do número de eleitores. Ou à Roma Antiga, onde o voto de um gato gordo da nobreza valia mais que o voto de cem manés da plebe. Hoje todo mundo tem de votar; no Brasil, inclusive, o sujeito é multado se não votar. Na Coreia do Norte se vota. Em Cuba se vota. Em qualquer ditadura se vota — basta que o eleitor vote em quem o governo mandar. O Primeiro Mundo em geral está fazendo uma adaptação, para uso próprio, do conceito de democracia tal como ela é praticada nas ditaduras. A chave, aí, é impor a seleção natural das espécies — de acordo com a mídia que promoveu a si própria às funções de editora da humanidade, os arquiduques da vida cultural e os milionários que têm uma “pegada mais social”. Permitem a existência de candidatos que não ultrapassem os limites de um Emmanuel Macron; um pouquinho à direita dele, já não pode mais. Trump, Milei e Jair Bolsonaro, apesar dos mais de 100 milhões de eleitores que se sentem representados por eles, são proibições absolutas — uma espécie de fatal error que a nova democracia não admite em hipótese nenhuma. O sistema cai se o eleitor quer votar neles.
As elites brasileiras, do alto do seu subdesenvolvimento, tentam imitar os europeus e os americanos, tais como eles são definidos pelo The New York Times, o Black Lives Matter e os ideólogos da Disney. (O STF, por exemplo, fica cada vez mais parecido com Leonardo DiCaprio e coisas que o valham.) O processo de seleção, aqui, é feito pela polícia eleitoral do regime, o TSE. O cidadão quer votar em Bolsonaro, ou em algum outro nome da direita e/ou extrema direita? Não pode. Tem de se contentar com uma Simone Tebet, talvez um Alckmin, no máximo um Lira-Pacheco da vida. Na Europa e no resto do Primeiro Mundo não se pode contar com o TSE, nem proibir os indesejáveis de se candidatarem até o ano de 2030. Joga-se tudo, então, na lavagem cerebral por parte da mídia, dos burocratas-raiz da máquina estatal e das “personalidades”, incluindo-se aí os politicões que dispõem do selo de aprovação da elite pensante. Não tem funcionado, porque o eleitor presta cada vez menos atenção nessa gente toda — e se sente cada vez mais distante dela. Mas a única opção disponível, na falta de um STF ou de um Nicolás Maduro, é a tentativa de fazer terrorismo democrático: “Não vote neles, porque se você votar a civilização acaba”.
É esse o discurso oficial e cada vez mais frenético dos “formadores de opinião”. Criaram novos crimes políticos, segundo a sua própria Tábua de Mandamentos, e definem como criminosos antidemocráticos quem não está de acordo com as suas posições — líderes políticos e quem vota neles. Uma de suas acusações mais frequentes neste momento é a “islamofobia”. Se o cidadão faz objeções à imposição de costumes, atitudes ou leis muçulmanas no país onde vive, então ele é um “islamofóbico”, e como tal uma ameaça para a democracia. Se quiser regras mais duras contra a imigração estará cometendo o crime de “xenofobia”. Se não andar a pé ou de bicicleta será um delinquente ambiental — salvo se rodar em carro chapa branca, claro. É ilegal, para os efeitos da moral política vigente, contestar as decisões da burocracia transnacional ou do seu próprio país — sobre vacinas, comida, produção de carbono, impostos, direitos individuais. É um delito, ou pelo menos um pré-delito, discordar da internacionalização das regras da sociedade, ou desses órgãos mundiais parasitas que o pagador de impostos tem de sustentar. Você é réu de “populismo” se tiver preferência por políticos populares. É réu de “nacionalismo” se defender o direito do seu país a fazer as próprias leis. É réu de “individualismo”, ou a favor da “exclusão social”, se acreditar que as pessoas devem ser compensadas de acordo com os seus méritos pessoais.
A angústia do “campo progressista” se estende agora ao crescimento popular da direita na França, na Alemanha e na Espanha. Acaba de ganhar as eleições em Portugal. Pode ganhar no Parlamento europeu
A ideia geral por trás de tudo isso é interditar a ação política de quem discorda do pensamento único — ou “deslegitimar”, como se diz, as suas crescentes vitórias eleitorais. A indignação da sabedoria oficial é tanto mais neurótica quanto mais limpa for a eleição, mais inteligente for o vencedor e mais indiscutível for o seu apoio popular. O caso mais notável do momento é o da primeira-ministra da Itália, Giorgia Meloni. Ela é de direita, e nunca teve a mais remota preocupação de esconder o que é. Também não se importa a mínima com o que os Macrons e os jornalistas do The Economist dizem a seu respeito. Não está no governo porque deu um golpe de Estado; está lá porque foi eleita em eleições absolutamente livres. Por isso mesmo, é odiada com tanta determinação pela mídia mundial “de qualidade”. A senhora Meloni não apenas pensa diferente e faz coisas diferentes, mas ganha eleições perfeitamente democráticas; para a esquerda, isso é intolerável. Temos, assim, que uma líder da estatura de Giorgia Meloni é uma “ameaça para a democracia”. Como não pode ser acusada de totalitária, inventaram um novo tipo de acusação contra ela: “iliberal”. Ou seja: os eleitos têm, obrigatoriamente, de ser o que a elite considera “liberais”. Se não forem, são um perigo de morte para a democracia. A mesma excomunhão atinge o primeiro-ministro da Hungria, Viktor Orbán, que tem o péssimo hábito de ganhar todas as eleições que disputa desde 2010 — cada uma delas inteiramente legítima. Já está no seu quarto mandato.
A angústia do “campo progressista” se estende agora ao crescimento popular da direita na França, na Alemanha e na Espanha. Acaba de ganhar as eleições em Portugal. Pode ganhar no Parlamento europeu — que não manda nada, é verdade, e funciona mais como um fórum de opiniões, mas é um espelho do que a maioria dos cidadãos está querendo. A questão real, na verdade, é muito clara — é o pavor fundamental que a ideia de maioria provoca na esquerda e nos seus acompanhantes. Seu pior problema de hoje, e de sempre, é a articulação da vontade popular. É o que se vê num retrato em alta definição do Brasil deste exato momento. Nada, até agora, deixou o regime mais transtornado do que a mobilização do povo na tragédia das enchentes no Rio Grande do Sul. A massa se mostrou muito mais eficaz, organizada e generosa do que o Estado e todo o seu aparelho. Civis estão salvando civis. O governo Lula, o STF e a maioria da mídia não suportam ver isso.
Informações Revista Oeste
foto: Reprodução
Recentemente, o governo federal, sob a liderança de Lula, anunciou a criação de uma campanha chamada “Seja um voluntário digital da informação”, que visa combater a disseminação de fake news no Brasil. A iniciativa convida cidadãos a se cadastrarem para receber informações oficiais e relatar possíveis notícias falsas, com o material reportado sendo encaminhado para apuração pelas autoridades competentes.
A campanha é vista por alguns analistas e opositores como uma tentativa de controle da opinião pública. Eles apontam para a história de regimes totalitários, como a Alemanha nazista e a União Soviética, que utilizaram estratégias de controle da comunicação e denúncia entre cidadãos para reprimir a dissidência e reforçar a autoridade estatal.
A Campanha “Seja um voluntário digital da informação”
De acordo com o ministro-chefe da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República (Secom/PR), Paulo Pimenta, o canal foi criado para promover a circulação de informações verdadeiras e responsabilizar os autores e propagadores de desinformação. Ele afirmou que todo material recebido será cuidadosamente verificado e poderá resultar em medidas legais contra os responsáveis por disseminar informações falsas.
No entanto, críticos do governo acreditam que a iniciativa pode ser mais do que uma simples campanha contra fake news. Eles temem que o programa seja um instrumento de intimidação e controle sobre quem se opõe ao governo, levando o país a um caminho perigoso de censura e perda de liberdades individuais.
Um Olhar Histórico
Historicamente, iniciativas semelhantes foram vistas em períodos sombrios. Na Alemanha nazista, cidadãos eram incentivados a denunciar vizinhos e até familiares que suspeitassem de atividades judaicas ou contra o regime. Durante a Revolução Comunista na União Soviética, sob o pretexto de proteger a ideologia do estado, a população foi incentivada a reportar atividades suspeitas, o que resultou em vastas redes de espionagem e repressão.
O Caminho para o Totalitarismo?
Se este programa continuar a expandir-se sem um controle republicano rigoroso, há um risco de que o Brasil possa evoluir para um regime onde a liberdade de expressão é severamente limitada e a mídia é rigorosamente controlada pelo estado. A história ensina que o controle da informação e a repressão de críticos são características típicas de regimes totalitários.
A intenção de combater fake news é, em si, positiva. No entanto, é crucial que a implementação de medidas para este fim esteja alinhada com os princípios democráticos e direitos humanos, garantindo que a liberdade de expressão e o direito à crítica sejam preservados. A vigilância sobre possíveis abusos é essencial para evitar que uma campanha legítima de combate à desinformação se transforme em uma ferramenta de repressão política.
É um momento crucial para o Brasil, onde a sociedade precisa estar atenta e engajada, garantindo que os mecanismos de controle da informação não comprometam os pilares democráticos e a pluralidade de opiniões.
Júnior Melo (advogado e Jornalista)
Informações TBN