“Espero que este álbum te inspire a se sentir único, forte e sexy”, escreveu Beyoncé ao anunciar o álbum “Renaissance”.
Na capa, a artista faz jus às suas palavras ao aparecer em cima de um cavalo holográfico e vestida por um traje de metal que cobre minuciosamente seu corpo, adaptando-se às curvas do corpo, como uma espécie de esqueleto humano. Ao mesmo tempo que futurístico. Trata-se de uma “arte vestível”, como o artista norte-americano Nusi Quero prefere referir-se ao próprio trabalho.
“Não sabia ao certo que seria uma imagem tão importante. Nem que estaria na capa do álbum da Beyoncé, pelo menos não no começo”, conta ele em entrevista exclusiva para Nossa, relembrando ainda ter acordado no dia da divulgação com seu celular lotado por mensagens e marcações no Instagram.
“Por mais que soubesse que existia uma possibilidade disso tudo acontecer, estava tentando me manter o mais ‘pé no chão’ possível”.
Com 34 anos, Nusi Quero ganhou notoriedade ao criar artes com formas orgânicas com o objetivo de serem vestidas. Entre as celebridades que já declararam adoração por suas criações estão nomes como Kylie Jenner, a estrela de “Euphoria” Hunter Schafer e a cantora Grimes. Com Beyoncé, o convite surgiu a partir da equipe da cantora: “Eles acharam meu trabalho e me perguntaram se eu poderia vesti-la. Foi simples assim”, diz enquanto ri.
O look de “Renaissance”, ao contrário da maioria de suas criações — feitas por meio do uso de uma impressora 3D —, foi elaborado a partir do garimpo de objetos na Fashion District, local em Los Angeles, nos Estados Unidos, onde materiais de moda são vendidos a céu aberto. A visita ao local, feita frequentemente por Nusi, foi onde o traje começou a ganhar forma, por meio da observação do artista por objetos que garantissem a harmonia procurada por ele.
“É um sistema. Não é uma única peça”, conta sobre o look que possui cristais em sua composição e pesa menos de 500 gramas. “Passei algumas semanas brincando com os materiais e conectando os elementos, como os spikes [de metal], porque uma vez que vai no corpo precisa ser forte e flexível. Não é uma moda tradicional, não são tecidos”.
“Depois de alguns testes, encontrei um único sistema que se encaixava em todo o corpo. Levou semanas para concluir e torná-lo ainda melhor para ser vestido”, revela sobre o processo.
Sobre a experiência em ter seu trabalho reconhecido por uma das maiores artistas contemporâneas, Nusi não poupa elogios à voz de “Break My Soul”: “É um sentimento extraordinário. Tenho muito respeito por ela como artista e por inspirar e empoderar indivíduos. Faz com que eu sinta que meu trabalho tenha significado”.
“Não que eu não sentisse isso antes, mas toda chance que eu tenho para que esse pensamento seja reforçado e faça com que eu me sinta melhor no que faço, me agarro”, completa.
O artista norte-americano Nusi QueroImagem: Reprodução/Instagram/@proudisproud
Quem vê tamanha proporção do trabalho feito pelo artista não imagina que tudo começou “meio que por acidente”, como ele mesmo menciona. Suas primeiras “artes vestíveis” iniciaram-se há relativamente pouco tempo, entre o final de 2019 e o começo de 2020: “Estava trabalhando como arquiteto e quando voltava para a casa sentia que queria fazer mais. Algo mais subversivo”.
Suas primeiras obras eram esculturas feitas a partir de peças de brinquedo. Como aviões e carros montáveis manualmente. A simetria dos veículos terrestres posteriormente fez com que Nusi começasse a fazer máscaras para o rosto, o que ele diz ter acontecido graças à pareidolia — fenômeno psicológico, comum em todos os seres humanos, responsável por fazer as pessoas reconhecerem imagens de rostos humanos em objetos, sombras, formações de luzes e em qualquer outro estímulo visual aleatório.
“Gosto muito de formas, como elas se encaixam e podem se conectar, até mesmo brincar uma com a outra”, explica.
Máscara criada por Nusi Quero por meio da impressora 3DImagem: Reprodução/Instagram
Com a pandemia, as lojas em que ele comprava esses brinquedos e objetos para suas criações fecharam as portas. A solução encontrada por ele foi mergulhar no uso do computador para ir ainda além: “Comecei a aprender a criar as minhas próprias formas”.
A primeira “arte vestível” surgiu depois de amigos o encorajarem. Impulsionado, Nusi comprou uma impressora 3D e passou a explorar ainda mais as formas tão vislumbradas por ele. “Eu imprimi meu primeiro design e pedi para que uma amiga viesse para testar”, relembra.
A maior parte do trabalho vem depois da impressão 3D. As peças podem parecer legais, interessantes, mas quando vai para o corpo de alguém, algo pode ficar desconectado. Faço muitas coisas depois, como cortes e ajustes, para que sejam mais confortáveis na hora vestir. É fascinante para aprender durante o processo. Ainda mais fascinante é como essas artes fazem as pessoas se sentirem”.
Nusi Quero
“Arte vestível” criada por Nusi QueroImagem: Reprodução/Instagram
“Arte vestível” criada por Nusi QueroImagem: Reprodução/Instagram
O artista menciona que seu maior desafio no trabalho é contemplar a diversidade dos corpos, por isso se dedica a produzir peças em pequena escala — a fim de manter particularidade e atenção a cada uma delas.
“Quero que as pessoas sejam capazes de vestir o que eu faço”, reforça. “Coloco muita energia e pensamentos sobre como fazer uma peça que possa se encaixar em diferentes tipos de corpo. Não digo que tenho completo sucesso nisso, mas estou me tornando muito melhor.”
“Arte vestível” criada por Nusi QueroImagem: Reprodução/Instagram
Harmonia é uma palavra citada com frequência por Nusi Quero durante a conversa — o que acaba por ser sua maior inspiração, citando exemplos arquitetônicos, da sua “antiga” carreira”: “Gosto de ver como minhas formas se moldam ao corpo de alguém. Na arquitetura, como um prédio que se encaixa perfeitamente no terreno e toda a construção se conecta”.
“Arte vestível” criada por Nusi QueroImagem: Reprodução/Instagram
Quando questionado sobre a mensagem que deseja passar com seu trabalho, Nusi Quero cita o desejo por envolver e emergir: “Não tenho um manifesto que sigo. Na verdade, é importante que eu não tenha”.
“Quero poder surpreender, os outros e a mim mesmo”, completa.
O artista diz que, nos últimos anos em que se dedicou a criar as “artes vestíveis”, comprometeu-se a a executar obras com beleza única — além de funcionais: “Quero que as pessoas que experimentem essas peças sintam essa experiencia transcendental. Algo que é único e excitante”.
“Arte vestível” criada por Nusi QueroImagem: Reprodução/Instagram
É uma experiencia incrível para mim fazer os tops e ver as pessoas usando, sentindo-se empoderadas, sexys e fortes. Esse é o sentimento que quero dar as pessoas.”
Nusi Quero
Por fim, ele finaliza: “Muitos dos motivos pelos quais faço arte é a realidade de que, se eu parar de criar e pensar em como tudo está f*dido [globalmente], eu vou desmoronar”.
Informações – Nossa UOL