Eu já contei aqui para vocês a história de quando, no começo do escritório, sem entrar honorário nenhum, eu passei bastante dificuldade.
Eu morava num quarto alugado, cujo único outro cômodo era um banheiro.
No momento mais crítico, após meses sem receber nada, minhas reservas acabaram.
Olhei para a conta corrente e o saldo era de apenas R$ 200,00.
200 fucking pratas.
Eu precisava pagar aluguel, a parcela do financiamento do carro e fazer feira — como a maior parte dos brasileiros.
Não tem como. É matemática.
Claro que bateu medo. E eu só pude rezar — uma das orações mais sinceras da vida — abandonando-me e pedindo uma solução para não ter que arrumar as malas.
Providencialmente, nos dias seguintes, um cliente (já esquecido até) apareceu e nos pagou e eu pude me virar por mais uns dois meses.
Eu não me envergonho disso. Pelo contrário, hoje conto isso com orgulho, porque faz parte de mim.
É o que me ajuda a não esquecer de onde vim e a ter empatia pelos outros que passam por essa situação.
É fácil defender lockdown quando você tem salário certo no fim do mês e pode fazer paralisação — como a maioria dos agentes públicos e burocratas que só vivem reclamando de “receber pouco”.
É fácil defender lockdown quando você é nascido em berço de ouro, mora em apartamento chique e “fica em casa” pedindo sushi e tomando vinhozinho enquanto assiste série na Amazon Prime.
O seu vinhozinho vai pagar o aluguel da dona Maria?
O seu sushi vai comprar a feira do seu João?
Algum burocrata vai doar o seu salário para ajudá-los?
Fala-se tanto em “efeitos colaterais” de remédios, mas não se pensa nos efeitos colaterais dessas medidas que também afetam pessoas.
Você não pode dizer que está cuidando de uma doença e, do outro lado, matar a pessoa de desemprego, miséria e fome — no fim, qual foi a vida que você conservou?
Então, não seja tão rápido para julgar as pessoas que precisam trabalhar.
Se a vida foi mais fácil para você, seja grato, mas não as julgue por elas não engolirem medidas desastrosas que acabam a vida delas, mas não arriscam nada da sua aí.
Tenha empatia.
Elas têm bocas para dar de comer e são mais vítimas dos dissabores da existência do que você.