Por José Aparecido Ribeiro
Para os apressados é importante lembrar que o tempo, a moral e a lógica da política não são as mesma das do povo
O povo brasileiro acordou com a sensação de ter sido traído, e alguns jogaram a toalha. A turma do deixa disso está em êxtase com o posicionamento desta quinta-feira (09) do presidente Jair Bolsonaro. Na leitura mundana e imediatista, Brasília hoje deveria acordar e ver 11 “traidores” dependurados em forcas na Praça dos Três Poderes. Esse é o desejo de milhões de pessoas. É legítimo? Sim, possível? Evidente que não.
Os ministros que chamaram o povo de “baderneiro”, “radical”, “insano” merecem punição, afinal se dizem defensores da democracia, mas se comportam como inimigos do povo quando agem sendo policiais, delegados, promotores e juízes, rasgando a Constituição que juraram defender. Dão provas do menosprezo que sentem pelo povo no próprio luxo que vivem, isso ninguém pode negar.
Fato é que a lei do talião, “olho por olho, dente por dente”, ficou para trás e os tempos são outros, aqui o buraco é mais embaixo. A surra precisa ser dada de outra forma, não na baioneta, mas na caneta e nas quatro linhas da Constituição – frase repetida centenas de milhares de vezes, mas pouco praticada por quem ataca o chefe do executivo.
Bolsonaro muito provavelmente não leu “A Arte da Guerra de Sun Tzu”, mas alguém deve ter lido e no pé do ouvido deve ter sugerido que ele aplicasse parte das teorias que estão lá. Também não deve ter lido “O Príncipe de Nicolau Maquiavel”, mas Michel Temer com certeza leu e citou trechos nas 5 horas que conversaram ontem quinta-feira (09).
O presidente pediu e o povo atendeu
O presidente pediu e o povo atendeu, fez o que ele precisava que os inimigos e o mundo visse no último 7 de setembro de 2021. Não foi por acaso a negação, o desespero, a manipulação de imagens e a tentativa tresloucada da imprensa de mostrar outra versão que não era a das imagens. Eles sabem o que significou o povo nas ruas, embora o desprezo deles pelo povo também seja maior do que a razão e os fatos.
Uma trégua às vezes é necessária para ganhar fôlego, desarmar o inimigo e se fortalecer para continuar na guerra. Apesar de esgotado, exaurido e legitimamente impaciente, o povo terá que compreender que não é hora de abandonar o barco e jogar a toalha. Conversando com gente mais experiente do que eu em Brasília tive noticias de que nos bastidores a trégua, que chamam de “pacto de não beligerância” estava sendo construído há um mês.
Bolsonaro não está sozinho no covil, conhece as serpentes e o modus operandi delas
Na mesa de negociações o executivo governamental está sendo representado pelo ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira. O legislativo tem na mesa o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP/AL) e o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM/MG) e pelo judiciário, responde o ministro do Supremo Tribunal Federal – STF, Gilmar Mendes, ele que se fosse jogado aos leões (povo), viraria pó.
Mas é assim a lógica e a moral da política, que não é a mesma dos homens. Basta ver onde foi parar Renan Calheiros. O fato é que os atos que alguns ministros do STF e a imprensa em uníssono chamam de “antidemocráticos” conferiu ao presidente um up-grade no palco dos acontecimentos.
Sabendo disso entra em cena como mediador, o animal político Michel Temer, homem que a história há de ser justa e reconhecer por ter tirado o Brasil do maior buraco da sua história, cavado por Dilma Rousseff e pelos aliados do PT que saquearam o cofres públicos por 20 anos.
Bolsonaro tem pela frente dependendo do Supremo Tribunal Federal ação que pede derrubada dos decretos de armas; o inquérito dos “atos antidemocráticos” devendo ser transferido para a PGR saindo das mãos de Moraes, seu maior desafeto. Tão importante e não menos falada, a questão Raposa Serra do Sol em Roraima.
Nas mãos do Legislativo, a aprovação de Emenda Constitucional que bota freio definitivo no STF limitando suas ações a questões constitucionais ou inconstitucionais, aumentando o prestígio do próprio legislativo. Não acabou ele terá que costurar a aprovação do ICMS fixo para combustíveis; o Auxílio Brasil e os precatórios, além da sabatina de André Mendonça para o STF.
Em troca, o presidente foi obrigado a contrariar os caminhoneiros em uma greve que estava pronta para um blackout que provocaria desabastecimento e impactos imprevisíveis na economia, obrigando o presidente a decretar a “Garantia da lei e da Ordem” – GLO, prevista da Constituição Federal.
Portanto, o recuo foi um ato simbólico e de boa vontade do presidente com os dois poderes que contou com a maturidade e sagacidade do “mordomo” e safo Michel Temer. Há quem diga que a participação dele nesta articulação não foi de graça. E, convenhamos, merecida pela sua capacidade e lhaneza do trato da política.
Ele vai receber apoio de Bolsonaro para sua candidatura a deputado federal podendo já na próxima legislatura, substituir Lira na presidência da Casa. Com efeito, em se tratando de Brasília, o melhor a fazer é manter o sentimento de patriotismo, esperar o lago decantar e o líder te surpreender, pois de bobo ele só tem a caneta Compass que escreve igual a Montblanc.
José Aparecido Ribeiro é jornalista