O preço do ar-condicionado deu um salto em meio a onda de calor no país. Só em novembro os preços subiram 4,22%, segundo dados do IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) divulgados nesta terça-feira pelo IBGE. Já o índice geral variou 0,28% no mês.
Esta é a maior alta para o item ar-condicionado, para meses de novembro, desde o plano Real, segundo dados do Sistema IBGE de Recuperação Automática (Sidra), do IBGE. Em 1994, a alta foi de 5,26%. O real entrou em circulação em julho de 1994 para conter a hiperinflação no Brasil.
O custo médio de um aparelho está ainda três vezes acima da inflação em 2023. O ar-condicionado ficou 13,97% mais caro no acumulado do ano até novembro, enquanto o índice geral de preços variou 4,04% no mesmo período.
Os números do IBGE apontam que, de 2020 para cá, o preço dos aparelhos desacelerou com mais força na passagem de outubro para novembro. Isso porque os preços costumam subir em setembro e outubro, devido a expectativa de maior demanda por conta das altas temperaturas no verão.
A diferença é que, neste ano, devido a onda de calor, o preço continuou com forte alta em novembro apesar da desaceleração frente ao mês anterior.
O aumento repentino da temperatura afeta a economia de diferentes maneiras. O calorão fez saltar a procura por ar-condicionado, elevando as vendas de aparelhos e a demanda por conserto e manutenção desses equipamentos. Além disso, levou trabalhadores de volta ao presencial e afetou a produção e venda de alimentos, elevando preços de hortaliças e legumes.
Segundo especialistas, a falta do produto nas lojas é resultado da combinação da demanda elevada, por causa das ondas de calor dos últimos meses, com a oferta prejudicada pelas dificuldades com o transporte, por causa da seca na Amazônia – toda a produção nacional de ares-condicionados vem da Zona Franca de Manaus, segundo a Eletros, entidade que representa a indústria de eletrodomésticos.
Do lado da demanda, as vendas de ares-condicionados registraram um salto de 38% no segundo semestre, até o fim de outubro, ante igual período de 2022, segundo a Associação Brasileira de Refrigeração, Ar-condicionado, Ventilação e Aquecimento (Abrava), entidade que representa empresas de diferentes elos da cadeia do setor, da indústria aos serviços de manutenção.
Um aumento nas vendas já era esperado para este ano, informou a Abrava, em nota, porque “2022 foi um ano de vendas muito ruins”, mas “a onda de calor de novembro veio colaborar ainda mais com esse cenário positivo”.
Em volume, as vendas apenas de aparelhos do tipo split cresceram 16% no primeiro semestre, para 1,483 milhões de unidades, conforme a entidade. A Abrava espera que as vendas totais de ares-condicionados cheguem a 4 milhões de aparelhos neste ano.
Apesar da demanda aquecida, a Abrava destaca os problemas de oferta para explicar a escassez de produtos nas lojas. As restrições no transporte ainda têm atrapalhado a produção. No meio da Floresta Amazônica, o polo industrial da Zona Franca depende dos rios para receber insumos e escoar os produtos acabados.
Segundo o Cieam, entidade que representa a indústria do Amazonas, menos de 1% da produção do polo industrial deixa o local via área. Segundo a Associação Brasileira de Armadores de Cabotagem (Abac), em torno de 60% da movimentação de cargas de e para a Zona Franca é via cabotagem, como é chamado o transporte marítimo pela costa de um mesmo país.
O segundo meio de transporte mais usado é o “rô-rô caboclo”, como é chamado na região o roll-on/roll-off, modal logístico que combina o transporte rodoviário com o aquaviário, com balças que carregam os caminhões.
Terminado o período de seca, que geralmente vai até setembro ou outubro, os rios da Amazônia começaram a subir de nível, e as condições de navegação melhoraram, mas a logística segue prejudicada, segundo o diretor-executivo da Abac, Luís Fernando Resano.
Entre meados de outubro e meados de novembro, nenhum navio de cabotagem conseguiu chegar ou sair do Porto de Manaus, disse o diretor. Desde então, sete embarcações conseguiram fazer o trajeto.
O problema é que, no momento, estão passando navios com “calado” (porção da embarcação que fica submersa) de 6,5 a 7 metros. Normalmente nesta época, já contando com a seca, é possível passar com calado de 8,5 metros a 9 metros.
– Voltamos a passar com navios menores e com capacidade reduzida, mas é melhor do que nada – afirmou Resano. Como os navios passam com capacidade reduzida, o frete fica mais caro. – A equação não fecha. O navio foi preparado para ir a plena carga, quando não leva, aumenta o custo – explicou o diretor da Abac.
A Aliança, operadora de cabotagem controlada pela gigante do transporte marítimo Maersk, o monitoramento permanente dos níveis dos rios amazônicos permitiu alertar aos clientes sobre os problemas logísticos deste segundo semestre. Isso permitiu às indústrias instaladas na Zona Franca “adiantar os embarques de produtos, com foco, principalmente, na Black Friday e no Natal, duas das principais datas do varejo no ano”.
Segundo o presidente-executivo da Eletros, Jorge Nascimento, com a retomada da navegação pelos rios da Amazônia, o problema de falta de ares-condicionados, tido como pontual pela associação de fabricantes, ficou para trás. A escassez foi pontual, em parte, porque, assim como comentado pela Aliança, as indústrias com fábricas instaladas na Zona Franca de Manaus se anteciparam.
– Onde houve problemas pontuais, entendemos que serão solucionados. Já tem uns 15 dias que os navios estão passando – afirmou Nascimento.
O dirigente ressaltou que há outros fatores por trás da inflação dos ares-condicionados, como o elevado nível dos juros, que encarece as parcelas nas vendas a prazo, e o alto custo dos insumos.
O Globo