Neste artigo, Chris Impey, professor de Astronomia na Universidade do Arizona, discute que há uma incerteza para os pesquisadores que começa já na definição sobre o que é a vida e o que é possível buscar para além do nosso planeta.
Vida extraterrestre pode não parecer nada com a vida na Terra: como astrobiólogos lidam com o desafio? — Foto: Adobe Stock
Temos apenas um exemplo de biologia no Universo: a vida na Terra. Mas e se a vida puder se formar de outras maneiras? Como procurar vida extraterrestre quando não se sabe como a vida extraterrestre pode parecer?
Essas perguntas estão preocupando os astrobiólogos, os cientistas que procuram por vida além da Terra. Para isso, os astrobiólogos estão tentando encontrar regras universais que regem o surgimento de sistemas físicos e biológicos complexos, tanto na Terra quanto fora dela.
Sou um astrônomo que escreveu extensivamente sobre astrobiologia. Por meio de minha pesquisa, aprendi que a forma mais abundante de vida extraterrestre provavelmente será microbiana, uma vez que células únicas podem se formar mais prontamente do que organismos maiores. Mas, para o caso de haver vida extraterrestre avançada lá fora, faço parte do conselho consultivo internacional do grupo que está elaborando mensagens para enviar a essas civilizações.
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Desde a descoberta do primeiro exoplaneta em 1995, foram detectados mais de 5 mil destes planetas que orbitam outras estrelas.
Muitos desses exoplanetas são pequenos e rochosos, como a Terra, e estão nas chamadas zonas habitáveis de suas estrelas. A zona habitável é o intervalo de distâncias entre a superfície de um planeta e a estrela que ele orbita que hipoteticamente permitiria que o planeta tivesse água em estado líquido e, portanto, capaz de suportar a vida como a conhecemos na Terra.
A amostra de exoplanetas detectados até agora projeta 300 milhões de experimentos biológicos em potencial só na nossa galáxia – isto é, 300 milhões de lugares, incluindo exoplanetas e outros corpos, como luas, com condições teoricamente adequadas para o surgimento de biologia como a conhecida na Terra.
A incerteza para os pesquisadores, no entanto, começa com a própria definição do que é vida. Definir vida parece ser fácil, já que reconhecemos a vida quando a vemos, seja um pássaro voando ou um micróbio se movendo em uma gota de água. Mas os cientistas não têm um consenso em torno de uma definição, e alguns acham que uma definição ampla de consenso sobre o que é vida talvez não seja possível.
— Foto: Science Photo Library
A Nasa define vida como uma “reação química autossustentável capaz de evolução darwiniana”. Isso significa organismos com um sistema químico complexo que evoluem ao se adaptarem ao ambiente. A evolução darwiniana diz que a sobrevivência de um organismo depende de sua aptidão para viver em seu ambiente.
A evolução da vida na Terra progrediu ao longo de bilhões de anos, de organismos unicelulares a grandes animais e outras espécies, incluindo os seres humanos.
Os exoplanetas estão extremamente distantes e com brilhos centenas de milhões de vezes mais fracos do que os de suas estrelas-mãe. Portanto, estudá-los é um desafio. Apesar disso, os astrônomos podem investigar as atmosferas e superfícies de exoplanetas semelhantes à Terra usando um método chamado espectroscopia para procurar assinaturas químicas de vida.
A espectroscopia pode, por exemplo, detectar assinaturas de oxigênio na atmosfera de um planeta como o que algas verde azuladas geraram por fotossíntese na Terra há vários bilhões de anos, ou assinaturas de clorofila, que indicam vida vegetal.
Mas definição de vida da NASA leva a algumas questões importantes, mas não respondidas. A evolução darwiniana é universal? Que reações químicas podem levar à biologia fora da Terra?
Toda a vida na Terra, desde um esporo de fungo até uma baleia azul, evoluiu de um último ancestral comum microbiano que viveu há cerca de 4 bilhões de anos.
Os mesmos processos químicos são observados em todos os organismos vivos da Terra, e esses processos podem ser universais. Mas eles também podem ser radicalmente diferentes em outros lugares do Universo.
Em outubro de 2024, um grupo de cientistas de diversas áreas se reuniu para pensar fora da caixa sobre a evolução. Eles queriam dar um passo para trás e explorar que tipo de processos criam ordem no Universo – biológicos ou não – para descobrir como estudar o surgimento de vida totalmente diferente da vida na Terra.
Dois pesquisadores presentes argumentaram que sistemas complexos de substâncias químicas ou minerais, quando em ambientes que permitem que algumas configurações persistam melhor do que outras, evoluem para armazenar quantidades maiores de informação. Com o passar do tempo, o sistema se tornará mais diversificado e complexo, adquirindo as funções necessárias para a sobrevivência, por meio de um tipo de seleção natural.
Eles especularam que poderia haver uma lei para descrever a evolução de uma ampla variedade de sistemas físicos. A evolução biológica por meio da seleção natural seria apenas um exemplo dessa lei mais ampla.
Em biologia, informação refere-se às instruções armazenadas na sequência de nucleotídeos em uma molécula de DNA, que coletivamente formam o genoma de um organismo e ditam a aparência e o funcionamento deste organismo.
Se você definir complexidade em termos de teoria da informação, a seleção natural fará com que um genoma se torne mais complexo à medida que armazena mais informações sobre seu ambiente.
A complexidade pode ser útil para definir a fronteira entre vida e não vida.
Entretanto, é errado concluir que os animais são mais complexos do que os micróbios. As informações biológicas aumentam com o tamanho do genoma, mas a densidade de informações evolutivas diminui. A densidade de informações evolutivas é a fração de genes funcionais dentro do genoma ou a fração do material genético total que expressa a adequação ao ambiente.
Organismos que as pessoas consideram primitivos, como as bactérias, têm genomas com alta densidade de informações e, portanto, parecem mais bem projetados do que os genomas de plantas ou animais.
Uma teoria universal da vida ainda é difícil de ser encontrada. Essa teoria incluiria os conceitos de complexidade e armazenamento de informações, mas não estaria vinculada ao DNA ou aos tipos específicos de células que encontramos na biologia terrestre.
Pesquisadores têm explorado alternativas para a bioquímica terrestre. Todos os organismos vivos conhecidos, de bactérias a seres humanos, contêm água, que é um solvente essencial para a vida na Terra. Um solvente é um meio líquido que facilita as reações químicas das quais a vida poderia surgir. Mas a vida também poderia surgir de outros solventes.
Os astrobiólogos Willam Bains e Sara Seager exploraram milhares de moléculas que podem estar associadas à vida. Entre os solventes plausíveis estão o ácido sulfúrico, a amônia, o dióxido de carbono líquido e até mesmo o enxofre líquido.
A vida extraterrestre também pode não ser necessariamente baseada em carbono, que forma a espinha dorsal de todas as moléculas essenciais da vida – pelo menos aqui na Terra. Ela pode nem mesmo precisar de um planeta para sobreviver.
Formas avançadas de vida em planetas alienígenas podem ser tão estranhas que seriam irreconhecíveis. Assim, quando os astrobiólogos tentarem detectar vida fora da Terra, eles precisarão ser criativos.
Uma estratégia é medir assinaturas minerais nas superfícies rochosas dos exoplanetas, já que a diversidade mineral segue a evolução biológica terrestre. À medida que a vida evoluiu na Terra, ela usou e criou minerais para exoesqueletos e habitats. Dos cem minerais presentes quando a vida se formou passamos para cerca de 5 mil tipos diferentes atualmente.
Por exemplo, os zircões são cristais de silicato simples que remontam ao período anterior ao início da vida. Um zircão encontrado na Austrália é o pedaço mais antigo conhecido da crosta terrestre. Mas outros minerais, como a apatita, um mineral complexo de fosfato de cálcio, são criados pela biologia. A apatita é o principal ingrediente de ossos, dentes e escamas de peixe.
Outra estratégia para encontrar vida diferente da existente na Terra é detectar evidências de uma civilização, como luzes artificiais ou o poluente industrial dióxido de nitrogênio na atmosfera. Esses são exemplos de rastreadores de vida inteligente chamados tecnoassinaturas.
Não está claro como e quando ocorrerá a primeira detecção de vida além da Terra. Pode ser dentro do Sistema Solar, ou farejando atmosferas de exoplanetas, ou detectando sinais de rádio artificiais de uma civilização distante.
A busca é um caminho sinuoso, não um caminho direto. E isso é para a vida como a conhecemos – para a vida como não a conhecemos, todas as apostas estão na mesa.
Informações G1