O Ministério das Finanças de Baden-Württemberg, Estado ao sul da Alemanha, tornou-se um ponto central das preocupações econômicas do país. Os alemães enfrentam um cenário de possível desindustrialização, enquanto se aproximam de uma eleição crucial para o chanceler Olaf Scholz.
O ministro Danyal Bayaz alerta para o fato de que a Alemanha desperdiçou os “dividendos da globalização” e “falhou em investir adequadamente no setor público durante anos de juros baixos”.
Agora, o país enfrenta crescente pressão energética, intensificada pela invasão russa da Ucrânia, além da concorrência chinesa e tarifas ameaçadoras dos EUA. Tudo isso colocaria seu modelo econômico em risco, segundo o jornal The Economist, do Reino Unido.
Bayaz lamenta a dificuldade da Alemanha em se adaptar às novas tecnologias, apesar de sua forte base em pesquisa e engenharia. A última grande startup de sucesso foi a SAP, criada em 1972. O país tem 60 vezes a população da Estônia, mas possui apenas 15 vezes mais “unicórnios” (startup de alto valor de mercado) do que os estonianos. Essa situação não é novidade.
A indústria alemã, especialmente as empresas Mittelstand, focou em inovações incrementais e, por isso, permaneceu despreparada para grandes avanços tecnológicos, como a transição para veículos elétricos.
Relações confortáveis entre empresas, bancos e políticos criaram uma complacência resistente a reformas necessárias, e a adesão a regras fiscais rigorosas resultou em infraestrutura deficiente, como pontes enferrujadas e trens atrasados. A análise é também do jornal The Economist.
Os altos custos de energia, ampliados pela necessidade de abandonar o gás russo, são um problema persistente para as empresas em um país onde a manufatura ainda representa 20% do valor agregado bruto — quase o dobro do valor na França. A produção industrial tem caído desde 2018, especialmente em setores energointensivos, como a siderurgia.
O desemprego no país aumenta, embora a partir de uma base baixa, e a maior montadora da Europa, a Volkswagen, considera fechar uma fábrica pela primeira vez em seus 87 anos de história. A ação poderia resultar na perda de até 30 mil empregos.
Carteiras de pedidos encolhem, enquanto investimentos planejados são adiados ou deslocados para o exterior. O fato é visto na Thyssenkrupp, cuja liderança afirma que o país está “em plena desindustrialização”.
Outros setores, como o varejo, também sentem o impacto. Depois da invasão russa, Raoul Rossmann, de uma cadeia de farmácias, buscou formas de reduzir custos de energia.
A falta de trabalhadores qualificados, agravada pelo envelhecimento populacional, é um desafio crescente, juntamente com camadas de burocracia pesada, muitas vezes atribuídas a regulamentos da União Europeia (UE), que custam à economia cerca de € 146 bilhões por ano, segundo o Instituto Ifo.
A relação comercial com a China mudou drasticamente. Nas décadas de 2000 e 2010, a Alemanha estava bem posicionada para suprir a demanda chinesa por carros e produtos químicos. Contudo, a China se tornou o maior exportador de carros, numa direta competição com a indústria alemã.
As exportações para a China diminuíram, enquanto os EUA surgiram para preencher parte dessa lacuna. Entretanto, tarifas norte-americanas iminentes podem afetar o PIB em até 1 ponto porcentual, segundo o Bundesbank.
Dentro da Alemanha, há divisões sobre como gerenciar as relações com a China. Algumas empresas do Mittelstand apoiam a política de “redução de riscos”, enquanto montadoras e conglomerados, como a Basf, continuam com investimento pesado no país asiático.
A Volkswagen e a BMW planejam novos investimentos na produção chinesa, e o lobby automotivo ajudou a Alemanha a se opor às tarifas da UE sobre importações de automóveis chineses.
No governo alemão, há tensões entre diplomatas e espiões que desejam punir a China por apoiar a Rússia com restrições comerciais. Em contrapartida, setores temem que tais medidas sejam prejudiciais para uma Alemanha de baixo crescimento.
A história da desindustrialização é complexa. A perda de empregos na manufatura reduz a produtividade, já em declínio, mas o valor agregado bruto na manufatura se manteve. Isso sugere que alguns fabricantes alemães produzem itens mais valiosos, apesar de uma produção menor.
Essas mudanças ocorrem em um momento político crucial. A Alemanha realizará eleições em fevereiro, depois do colapso da coalizão de três partidos. Friedrich Merz pode liderar a próxima coalizão, com possíveis reformas econômicas em vista.
Reformas no freio da dívida são vistas como fundamentais para impulsionar investimentos e crescimento de longo prazo. No entanto, qualquer alteração constitucional requer uma maioria de dois terços no Parlamento, o que pode ser complicado por possíveis bloqueios legislativos.
Thorsten Benner, do Instituto de Política Pública Global de Berlim, observa que a Alemanha passou do “otimismo fácil”, dos anos de Angela Merkel, para uma “armadilha de melancolia”, em que política disfuncional, limitações fiscais e desconfiança pública se reforçam.
Ele espera que o próximo governo possa agir como um “disjuntor” e trazer mudanças significativas.
Informações Revista Oeste